Maria Amélia Mano
Meu pai, agrônomo,
diz, com certeza, que dia 12 de outubro não é só dia da criança, mas é dia da
árvore e portanto, dia dele. Então, essa data era dividida entre pai e filhas
crianças. Ele nos dava bonecas ou passeios e nós fazíamos nossos presentes:
cartões com desenhos de flores, matas, árvores, plantações.
Dele também, a
mania de juntar sementes ou galhos para plantar. Desde que mudamos do nordeste
para o sul, esse vício se potencializou na tentativa de fazer um pomar tropical
na quase fronteira uruguaia. E assim é que, em viagem, me arrisco em algumas
aventuras biológicas para fazer ele mais feliz.
Pitombeira é árvore
comum e linda, resistente às intempéries da caatinga e do cerrado. Alegria de
pássaros e meninos que fazem careta com aquela sensação de gastura nos dentes,
lá atrás da boca. Adstringente, parece que é a palavra certa. Mas bofetada,
chute forte e sopapo, que é o significado em tupi, dizem mais da pitomba.
Nome de bloco de
carnaval de Olinda de mais de 70 ano, Pitombeira dos Quatro Cantos tem
estandarte preto e amarelo. Amarelo cor da polpa da frutinha de casca dura e
resistente. A frutinha que eu ganhei em galho grande, em viagem. Aventura de
levar galho de pitombeira para o sul, de avião.
Coisa proibida.
Planta silvestre. Voo longo. Tensão no momento do RX, da revista. Posso virar
uma criminosa a qualquer instante. Passo pelos obstáculos e rostos desconfiados
com cara de nada a declarar. Disfarce por fora e certo friozinho na barriga,
por dentro. Mas se uns passam com cocaína, eu havia de passar com pitombas.
Chego ao meu
destino com a carga proibida. Entrego ao pai o galho e conto da aventura do
avião. Ele ri como ri de quase todas as coisas proibidas, como as regras que
quebramos, as pequenas subversões. Sentiu orgulho da travessura ilegal.
Contravenção. Nada que uma pitombeira no sul não justifique.
Faz uma semana e
ele me disse. De tantas sementes em muitos substratos, uma brotou. Plantinha de
dois centímetros, pirata, que atravessou país-continente, folia dos Quatro
Cantos, alimento dos passarinhos, festa dos meninos danados do sertão. Aventura
minha na ilegalidade.
Pai quer que a
pitombeira vá para o parque da Redenção em Porto Alegre. Foi uma vez só lá e amou.
Diz que quer as cinzas dele lá, quando se for. Mas vai demorar...
Mais tarde,
descobrimos que o dia da árvore e do agrônomo é 13 de setembro. Por nós, não
comemoramos mais o dia da criança. Mas comemoramos o dia do pai em todos os
dias dedicados à natureza.
Torço para
continuar comemorando ainda por muito tempo e que ele siga sonhando em trazer
siriguela, sapoti e jaca para o sul. Torço pelo dia das árvores, do pai, do agrônomo, da
criança. Torço pela pequena árvore que cresce com cuidados de bebê, dormindo do lado da cama do pai, pra aquecer as folhas, pra sobreviver ao frio de junho.

Ai, pitombeira, vê
se resiste!
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