05 outubro 2018

COISAS ESTRANHAS

Caverna do dragão. Imagem capturada através do Google.

Ernande Valentin do Prado





O filho de um colega foi roubado na vila onde mora. Saia pela porta da sala e foi abordado por um sujeito de moto. Coisa corriqueira, infelizmente em qualquer lugar do Brasil e em outras partes do mundo, principalmente para quem é obrigado a morar na periferia, não tem carro blindado e nem ganhar acima de 10 salários mínimos por mês.
Quando se é assaltado, em qualquer parte do mundo, o que se deve fazer?
Quem se deve procurar para denunciar o roubo e tentar reaver o que fora roubado?
Imagino que a maioria das pessoas vá dizer que é a polícia!
Talvez em outras partes do mundo isso seja certo, mas no Brasil essa pode ser a resposta mais errada de todas, e isso não é opinião minha (que nunca fui roubado por ladrões armados, só por aqueles de terno e gravata).
Quem demonstra o equívoco é a própria corporação policial.  Ela diz, quando se vai prestar queixa: “você sabe que não adianta nada, só serve para as estatísticas, não é?”.
E ainda acrescenta: “quer mesmo fazer o boletim de ocorrência?”.
E parece que não é só nas questões de furtos que a polícia demonstra essa ineficiência, uma vez que estatísticas mostram que de cada 100 assassinatos cometidos no país, menos de cinco são resolvidos. Fica a impressão de que nem tentam mais, como no caso dos furtos.
Meu colega, que não é nenhum Mané, foi à boca e conseguiu falar com um dos gerentes do tráfico. Em menos de meia hora conseguiu o celular de volta e a promessa de que o ladrão seria expulso do bairro.
Eficiente, não é verdade?
E não é só neste tipo de assunto que o tráfico é mais eficiente do que certas instituições públicas. Quem nunca ouviu falar que em algumas comunidades do Rio de Janeiro é o tráfico é que socorre quando falta gás, quem constrói praças e até Unidades de Saúde?
Porém não deixa de ser uma coisa lamentável, não é mesmo?
Isso porque revela o quanto o estado e suas instituições estão “cagando e andando” para as necessidades da população.
Parece que é fato que hoje se pode confiar mais no bandido do que na polícia (ao menos entre a população mais pobre). As autoridades dão várias explicações do porque é assim, dizem que as leis não ajudam e coisa e tal. Mas nenhuma desculpa convence, até porque as leis, quando eles querem, funcionam muito bem. Ao que parece a polícia brasileira é capacitada para matar, não para resolver os crimes. E não sou eu quem disse isso, foram às estatísticas internacionais. Elas afirmam que a polícia brasileira é a que mais mata no mundo. Mais mata e mais morre isso porque, como diria D2: “Também mata quem atira”.  
Infelizmente essa história, entre várias outras, é parte da explicação do porque a população confia mais no bandido do que na polícia. E também serve para ajudar a explicar porque uma parte bem grande da população prefere eleger um presidiário, como dizem os detratores do ex-presidente Lula, do que as autoridades que o prenderam.
Embora a população não acredite que Lula ou qualquer outro político, seja inocente (de nada), está vendo aquele que consideram o melhor presidente que o Brasil já teve, preso, enquanto outros, com tantas ou mais acusações, soltos e dando entrevistas.
As aulas de história (da ditadura e depois dela) não ajudaram os estudantes a conhecer o que de fato aconteceu no Brasil, desde a invasão portuguesa e nem desde o golpe militar de 1964, esse que alguns conseguem até negar que existiu.
De 1964 até 1988, foram os militares que decidiram os rumos do Brasil. Tomaram o poder na mão grande e dirigiram o Brasil como queriam e quase sempre na ponta da baioneta. Faltavam escolas para os filhos dos trabalhadores, só tinha direito aos serviços de saúde quem tinha carteira assinada (e eram pouquíssimas pessoas), os outros só por caridade das Santas Casas. Os salários, para quem estava empregado, eram baixíssimos e quem ousasse pensar em greve era preso, torturado e alguns até assassinados.
Sobravam epidemias de todo tipo de doenças, corrupção em diversas esferas, violência policial e esquadrão da morte nas grandes cidades. Qualquer tipo de pensamento, que não o oficial, era proíbo e tido como perigoso. A ditadura proibia ouvir certas músicas, ver certos filmes e até novelas, consegue imaginar viver assim?
Durante a ditadura tinha tortura, perseguição, sequestro, assassinatos e a inflação, durante o governo do último general no poder, ultrapassou 250% ao mês.
Como herança desta época absurda, temos, talvez, as instituições mais esdrúxulas do mundo, como um judiciário em que juízes fazem as leis, vivem como reis, recebem auxílio moradia, mesmo tendo casa na cidade onde trabalha. Aqui tem até ator pornô que é conservador e moralista; pastores milionários pedindo dinheiro para cristão desesperados e famintos; imprensa que escolhe as histórias que irão contar a depender do quanto vão ganhar.
Como se pode ver, a população confiar mais em bandido do que na polícia, não é a coisa mais estranha que acontece o Brasil.



[Ernande Valentin do Prado publica no Rua Balsa das 10 às 6tas-feiras]

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