Ernande
Valentin do Prado
“Não ligue pra essas caras tristes
Fingindo que a gente não existe”
Cazuza
Quando
eu era estudante de Enfermagem, na PUC do Paraná, a professora, no meio do
estágio de Saúde da Criança, me disse que eu não deveria ser Enfermeiro.
Fiquei
curioso com a afirmação e perguntei porque, afinal, eu tinha um bom desempenho,
no meu julgamento e em minhas notas oficiais.
Ela
então disse, sem nenhum constrangimento, que eu era crítico demais e deveria
ser jornalista.
Desde que me formei e até antes, sempre tive uma postura muito crítica
em relação aos serviços de saúde. Achava, por exemplo, que as pessoas eram
muito maltratadas nos hospitais, que era o que o espaço que conhecia, na época.
Ainda penso assim e não só dos serviços hospitalares e públicos e sim de
todos os serviços de saúde, inclusive os particulares, principalmente porque
eles se acham melhores e quase sempre estão abaixo do que deveriam ser.
Como não poderia ser diferente, também pensava e ainda penso, que a
Enfermagem é parte dos problemas que vejo nos serviços.
Será que a enfermagem brasileira poderia fazer a diferença nos espaços
que ocupa no Sistema de Saúde?
Não estou falando, é claro, do espaço de trabalho, uma vez que a
enfermagem sempre foi, em quantidade, o maior contingente profissional do
sistema.
A pergunta é justamente sobre o por que, sendo o maior efetivo dos
serviços de saúde, e partindo do pressuposto de que poderia fazer a diferença,
parece fazer muito pouco ou estar aquém do que poderia, com o que a enfermagem
estuda e conhece das necessidades de cuidados.
Por que a enfermagem é tão pouco ouvida nos espaços de tomada de
decisão?
Podem estranhar esses questionamentos, uma vez que a Enfermagem ocupa,
em muitos serviços, justamente cargos de gestão.
Eu mesmo saí de Curitiba, em 2004, porque não via perspectiva de
realizar cuidados diretos de enfermagem, que era o que eu realmente queria, mas
limitar meu fazer aos aspectos administrativos, fosse no serviço público, fosse
no serviço privado.
Então, a questão deveria ser: será que ao ocupar cargos de
administração, a enfermagem está fazendo gestão com base nos conhecimentos da
enfermagem, com base nos princípios de cuidado, de promoção de saúde ou faz
gestão com base na eficiência organizativa e financeira pura e simplesmente?
Faz alguma diferença, para a população, para o serviço, para a equipe,
se a gestão é feita por uma Enfermeira ou por qualquer outro profissional?
Por que, no dia a dia dos serviços, a Enfermeira é quem mais faz, porém
continua com a imagem de que é ajudante?
Será apenas uma questão de gênero, de visão de mundo ou há algo na
postura da Enfermagem que leva a população a pensar assim?
O que me leva a história que abriu esse vídeo e a pergunta que fiz a
professora, logo depois dela dizer que eu era crítico demais para ser
enfermeiro:
A enfermagem tem que ser sempre dócil, passiva e obediente ou pode e
deve contribuir de forma ativa para pensar e repensar
o SUS, segundo os princípios do cuidado humano?
Eu sou Ernande Valentin do Prado, Enfermeiro há quase vinte anos e ainda
acho que podemos ser mais.