Ernande Valentin do Prado
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Fotografia de uma tatuagem de parede - sala de aula em Catolé do Rocha, terra de Chico Cesar, 2018. |
Certa
vez, concorrendo a uma vaga de orientador em um curso de Especialização em
Saúde da Família, tive que descrever “meu sonho para Saúde Pública Brasileira”.
O que pensei, diante da forma como eu seria avaliado, foi mais ou menos isso:
―
Caraca, um curso que pergunta uma coisa dessas deve ser muito maneiro. Preciso
muito passar e ser parte disso.
Ao
mesmo tempo senti-me com uma imensa responsabilidade. E se não gostassem de meu
sonho para a Saúde Pública Brasileira?
Isso
estava além do que eu poderia controlar, tudo que podia fazer era dissertar o
melhor possível em quinhentas palavras, no máximo. No entanto, é inegável que
seria muito triste não ser aprovado em um curso que tinha a ousadia de
perguntar qual meu sonho…
Sonho,
utopia, inédito viável. Tudo, no contexto, era uma coisa só. O texto que
escrevi foi meio que um testemunho:
Cursei
a faculdade de enfermagem em Curitiba, Paraná, até junho de 2004. Menos de 20
dias depois estava trabalhando em um pronto socorro no norte do Espírito Santo.
Não era ainda o meu sonho. Eu desejava ser enfermeiro de Saúde Coletiva, por
isso, seis meses depois, mudei-me para Rio Negro, no Mato Grosso do Sul, uma
cidade com aproximadamente cinco mil habitantes, localizado na “beira do Pantanal”.
Fiz
essa opção porque queria colocar em prática um modo de fazer saúde, reafirmado
pela Portaria 648/2006, na qual acreditava. Desejava ir além
das atividades administrativas e assistenciais mínimas esperadas de um
enfermeiro na Estratégia Saúde da Família (ESF). Queria o novo, queria andar na
rua, fazer programa de saúde na rádio comunitária, organizar grupos nas
comunidades, conviver com a equipe, participar das festas, das lutas, das
alegrias e até das tristezas da comunidade. Enfim, queria ser um enfermeiro não
apenas na tradição nightingaleana mas também na tradição cristã, pois no
período cristão as enfermeiras já faziam visita domiciliar e foram as
verdadeiras precursoras da (ESF), conforme conta a historiadora Oguisso (2009).
E principalmente, desejava ser um enfermeiro engajado na construção de
uma sociedade justa e solidária, da qual o Sistema Único de Saúde (SUS) fazia e
ainda faz parte.
Queria
participar da construção de um serviço de saúde onde o enfermeiro é parte da
estrutura humana responsável por proporcionar cuidado e bem-estar à população e
não apenas gerenciar situações de doença.
Esse
sonho, embora tenha vivenciado em vários lugares, ainda é um sonho para maioria
dos profissionais que ainda ousam sonhar.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria 648 -
Política nacional de atenção básica. Ministério da Saúde; 2006.
OGUISSO, T. As origens da prática
de cuidar. In: OGUISSO, T. (Ed.). Trajetória histórica e legal da enfermagem.
Barueri-SP: Manole, v.1, 2007. p.03-29.
[Ernande Valentin do Prado publica no Rua
Balsa das 10 às 6tas-feiras]