Maria Amélia Mano
Para
Aninha
Por que esperar se podemos começar tudo
de novo
Agora mesmo
Renato Russo
Retorno de férias de
julho, 30 dias. Tal qual quando voltei em março, sempre algo se renova,
recomeça. Em março, lembrei de todos os “sóis” vistos, partilhados em fins de tarde, se escondendo em chapadas,
descansando de céus imensos. E escrevi sobre o início de um ciclo, falando
sobre o fim do dia. É sempre assim, princípio e fim estão sempre de mãos dadas
avisando que podem acontecer a qualquer momento. Ainda que o momento seja esse
espetáculo de retirada e despedida que, sabemos, acontece todos os dias.
Sempre
deve haver algo de novo no mesmo gesto. Assim, podemos sempre dizer o mesmo,
fazer o mesmo: tomar o leite, lavar as roupas sujas, limpar a casa, pegar o
ônibus, caminhar na rua, bater o cartão. Mas nada será exatamente igual, como o
sol não é o mesmo cada vez que se vai. Gases e umidade do ar, nuvens, posição
da terra, marés, ventos, poluição e um sem número de elementos para que cada
fim de dia seja único. Assim como é com a vida que passa meio no “ligeirão” dos
atos que se repetem, tentando fazer sentido.
Assim
é que, de férias e em espetáculo turístico, assisto a um pôr de sol famoso. João
Pessoa, Paraíba, o primeiro sol a se pôr no Brasil. Homens e mulheres que vivem
de marés e pôr de sol, vendendo passeios, diversões, enfeites e sorvetes,
juntando barcos e dirigindo vans e balsas. Fotografo no celular e envio para
minha irmã na partilha de momento. Ela, Aninha, também está de férias com a
família e retorna, no dia seguinte para sua casa. Chegando em casa, Aninha me
envia a foto do pôr de sol do seu quintal e escreve: “em casa...”
Ao
ver o sol da Aninha, me enchi de saudade e ternura. Saudade do quintal dela e
do barulho das crianças, da dança maluca da Duda, dos olhares charmosos do Dani
que apesar de querer ser homenzinho, ainda tem o mesmo olho de quando o vi pela
primeira vez, com minutos de nascido. Quase escuto as fantásticas histórias do
Dé em mundos que só ele tem. Sinto o vento das plantinhas que ela semeia e
muda, o cheiro das ervinhas da hortinha que cuida, as flores que se orgulha em
estarem mais bonitas que as flores da mãe.
Vejo
o mesmo sol, mas é um outro, em outro lugar do meu coração. Sol de aventura na
rua e sol de quintal de casa. Sol de rua pode ser familiar, amigo. Sol de
quintal pode ser aventureiro, na imaginação de crianças que criam e recriam
imensidões de terras e castelos a serem conquistados. Mas o que faz o sol do
quintal brilhar mais no meu coração e se pôr com mais nuvens nos céus e nos
olhos é esse sol de quintal distante e amoroso da Aninha. Quintal de
abraços. Quintal de encontros. Quintal sem barcos e balsas, sem vendas, sem
espetáculo.
Assim,
nesse começar tudo de novo, todos os dias, volto para o que me fez e me faz ser
quem sou. O desejo do novo, da aventura, da descoberta. Também o abraço dos cheiros de
mato e criança que conheço, os colos, as costuras da mãe, de casa, os quintais
de cachorros e músicas dos anos 80. Nossas vidas, todas, sempre, separadas
entre sóis que nascem e morrem. Nossas horas, muitas, entre sorrisos e
lágrimas, esperas de encontros e despedidas. Nossas histórias, tantas, que
sempre se cruzarão em quintais de cadeiras, conversas, infância, sonhos e essa velha conhecida saudade.
Referência:
texto, VER O SOL SE PÔR VERMELHO
Foto do
celular da Aninha, enviada dia 17 de julho, às 18:05.
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