Maria Amélia Mano
Trabalho.
E caminho pela vila pensando e inventariando o lixo das esquinas, das casas, os
esgotos, os bueiros e bocas de lobo. Focos de mosquito e ratos. Mas, também,
registro resistências em canteiros coletivos de rosas e ervas de chá de cuidar.
Ah, queria poder resumir as 177 fotos tiradas em poucas palavras de explicar,
de entender, de planejar e tentar fazer, junto, com as pessoas, sempre.
Semana
que foge. E ando com pouco peso nas costas porque já sei escolher o que deve
caber para não pesar. A arte de fazer mala pequena. As apertadas 250 palavras
do resumo do congresso que já fiz. O relatório da viagem que quero que seja
denso e rico e que mostre o essencial. O tal do currículo lattes que adio
atualizar e que deve dizer tudo de mim. Mas nem o lixo e nem as rosas dizem
tudo desse lugar que caminho...
Não
a verdade, que essa é impossível, mas o essencial, esse que é difícil e que
sempre busco. Poucas frases que dizem de um mundo. Podem se repetir e serão
valiosas. Mantras. Imagens que nem precisam ser traduzidas, linguagens
universais de olhares. O pequeno que é imenso. Essa capacidade de dizer tudo em
poucas linhas. Esse único mágico que por caber na palma da mão, significa
inteireza.
Penso
nisso como missão desejada, aprendizado para um tempo meu que recomeça em novo
ciclo que completo de vida. Como ser haicai frente a exigência da explicação?
Essa explicação que nem deixa o outro se surpreender, buscar outros
significados. Essa que vem com a verborragia de uma ciência carente de produção,
análise, interpretação. Ciência que não entende que o sentido todo pode estar
em um único olhar ou em um beijo.
Na
vila, um cano furado e meninos em festa no calor de rachar. Felicidade e brincadeira.
Aquela meninada era a palavra, a senha de entrada ao mundo de simplicidade e
riqueza que queria descrever. Ser esse banho. Ser essa água. Ser essas
mãozinhas molhadas que me acenam e ser alguém que devolve o aceno e sorri,
sabendo que, brincando com eles, também sou um pouco eles, na tarde desse verão
que se vai, como o tempo e a infância, como a vida.
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