Maria Amélia Mano
Helena ausente, mas presente, sempre. Ela que me ensinou sobre as coisas
vivas com as conchas do mar que voltei a me banhar. Também me ensinou sobre a
morte quando me contava da corda bamba em que se atirava, sem rede de proteção:
vício, vírus, noite, rua, novo amor.
Quis ser mãe. Recomeçar em novo sonho.
Novo corpo, quem sabe.
Primeiro uma gravidez sem exame
confirmatório. A psiquiatra me ligava preocupada. Psicose. Eu seguia fazendo o
pré-natal imaginário, esperando o tempo resolver o que o desejo não deixava. O
que a esperança teimava em seguir sem nenhuma razão. E o leite saia dos mamilos
como promessa.
Helena não pariu seu mistério, seu
recomeço. Abortou em realidade e insistiu. Perseguiu. Até que ele veio em
salvação e batimento de coração no ventre aumentado. Gestação. Risco e exames.
Felicidade. Antes que o sangue mostrasse que ainda não era hora de um filho,
Helena descobriu que era sã...
Sim, um exame negativo em anos de uso
de antirretroviral. Milagre ou erro. Advogado, revisão de prontuário, relatórios
e justificativas. Caso único, raro. O que aconteceu? Da dor da perda, Helena
renasceu. Do sangue do filho que não veio, a certeza de que a vida dava uma
nova chance. Ela sempre dá.
E então, foi morar na praia. Sonho
antigo. Trabalhar em galpão de reciclagem limpo e bonito que parece shopping.
Terminou com o companheiro que decepcionou. Saiu de uma religião e entrou em
outra. Igreja de bairro, de canto, de festa. Mudou tudo, porque tudo pode
mudar. Pode ser revolução.
Sei de Helena pela irmã que me conta dela. Helena que me
ensinou sobre vida, morte, recomeço a qualquer preço. Esperança que produz
milagre. Helena na praia. Helena feliz, com saúde. Quase mando recado. Peço que Helena me
traga uma concha, a primeira que ver, a concha que fala e ensina e é cheia de
histórias e memória. Está viva. Como a nossa capacidade de sonhar e mudar.
Para entender Helena:
Essas Coisas Vivas I – publicada em 14/07/15
Essas Coisas Vivas II
– publicada em 10/11/15
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