Ernande Valentin do Prado
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Exposição na Casa de Pólvora. Foto: Ernande, 2018. |
Fabíola despediu
Silvia, sua empregada mais antiga. A primeira a ser contratada, quando a
confecção ainda era na garagem de casa e não no imenso galpão onde é agora.
Silvia ajudou Fabíola e
a fábrica de roupas a prosperar, trabalhou dia, noite, sábados e domingos. Costurava,
desenhava modelos novos, escolhia cores, cuidava da qualidade, pacientemente
esperando o bolo crescer, como falava Fabíola, talvez inspirada pelo pai, um
cabo do exército e dizem que torturador durante a ditadura militar.
Durante a licença
maternidade de seus três filhos, ordenhava o peito de noite e deixava em um
frasco para sua mãe dar às crianças, num copinho, como a enfermeira do posto de
saúde ensinou.
Nos últimos tempos,
dizia Fabíola, a empregada já não era mais a mesma, não reconhecia suas
atitudes, que sempre foram tão dóceis. Silvia vivia pedindo aumento e queria
que lhe assinasse a carteira, queria receber horas extras, quando tivesse que
trabalhar depois do horário.
— Reclamou até por não
ter uma casa grande como a minha, porque seus filhos não estudam numa boa
escola particular, como os meus. Vê se pode, Padre?
Pausou um minuto,
esperando que o Padre, do outro lado do confessionário dissesse alguma coisa,
mas diante do silêncio que se prolongou, acrescentou:
— Coisa de gente
invejosa, não é mesmo Padre José Carlos?
Outra pausa esperando a
confirmação, que de novo não veio. Então continuou:
— Inveja é pecado
mortal, não é Padre?
[Ernande Valentin do Prado
publica no Rua Balsa das 10 às 6tas-feiras]
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