23 abril 2019

QUADRILHA


Maria Amélia Mano

Enganos me fizeram melhor e mais forte. Caminho errados me mostraram outras possibilidades. Então, me arrepender do feito-e-do-não-feito seria lamentar a oportunidade de viver o que vivi. 

      Mas, lá, longe, em algum lugar da infância eu queria ter vivido, de novo, aquela festa de São João na escola. Queria ter feito diferente.

Meu par sonhado não veio e, em substituição, veio um outro par inusitado, menos charmoso, menos arrumado. Eu fiz birra. Acabei dançando com a profe e nem me lembro se ele dançou...

E lembro do olhar comprido dele, menino. Lembro da carinha de decepção. Passou tempo e a sensação de ter feito mal, de ter ferido e de não ter vivido alguma surpresa depois de um plano frustrado.

Sim, aprendi com os desacertos, os desvios, os planos B e C, às vezes Z. E danço com quem quer dançar quadrilha ou o que nem sei ou o que nunca dancei. E danço sozinha, se precisar pra ser feliz.

Por isso, faço sempre o que deveria ter feito antes: puxo o inusitado pra dançar, o menino de olhar triste, pulo para o centro da grande roda. 

        Provo todos os dias das surpresas boas e más. Pra (me) mostrar que o não sonhado pode ser muito, muito melhor e mais mágico.

         Que a vida essa é feita do que se quer e do que não se quer. Que  a vida essa é quadrilha de música boa e ruim. E que nos resta sempre dançar, rodar, pular fogueira e sonhar, ainda.


Oficina de Narrativa da Unidade de Saúde Santíssima Trindade – texto de 10 minutos (reescrito)

2 comentários:

  1. Que lindo!!! Adorei! Não me lembrava dessa quadrilha, mas que bom que ficou uma lição tão bonita!!!

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