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08 setembro 2017

MANOBRAS - FRAGMENTOS DE MEMÓRIAS VERDE OLIVA

Imagem capturada na internet, 2017.
Ernande Valentin do Prado

Os caminhões do quartel eram capazes de subir até paredes, dada a força dos motores, a tração quatro por quatro, mas não andavam bem no asfalto. Perto do fim do ano formos para manobras em Santa Catarina. Deveríamos chegar em poucas horas, em uma situação normal, porém com os caminhões do exército, movidos a gasolina, levamos três dias.
No primeiro dia chegamos em União da Vitória, na divisa dos estados. Ficamos no batalhão sediado lá. Nos colocaram em um alojamento imundo, com camas sem colchão, cheio de poeira, o que revoltou o Sargento Borba, acho que o único viu onde os soldados ficariam.
Passamos a noite nestas condições e seguimos em frente, bem cedo no dia seguinte. Viajamos o dia todo na carroceria do caminhão, sentados em bancos de madeira até chegar em Palmas, lugar horrivelmente gelado, mas limpo. O batalhão parecia novinho e formos muito bem recebidos, integrado a tropa local e foi até agradável conhece-los. Um dos antigões de nossa companhia inventou de ler a mão dos soldados e ganhamos a simpatia de todos. Até minha mão o cara leu. O incrível é que tudo que ele falava fazia sentido.
No dia seguinte chegamos em Concordia, cidade de Santa Catarina, onde encontraríamos tropas de todo o sul do Brasil. Ficamos acampado em um fábrica de ração da Sadia, dormimos nas mesmas baias onde dormiam os porcos, desalojados naqueles dias para dar lugar aos soldados de exército brasileiro.
Lembro de pouca coisa desse acampamento. Numa dessas lembranças o Aspirante que comandava o PELOPES colocou toda a tropa em formação e tentava falar alguma coisa, mas eu não ouvia, nem notava sua presença. Então o cara se irritou e gritou:
- Entendeu, Prado?
Eu respondi na mesma hora: claro, perfeitamente. O homem não se conformou e perguntou: e o que foi que eu falei?
Passei uma tremenda vergonha na frente de todos: não sabia o que o sujeito falava, nem sabia que ele estava ali, para ser sincero. Claro que Ugo não deixou passar, ficou o resto do dia me sugando, que era como se chamava bullying na época.
Como em todos os acampamentos, nesta também chovia e fazia frio. Andávamos de caminhão de um lado para o outro, em estradas que pareciam sempre iguais. O povo era muito branco, muitas mulheres louras, magras, lindas, ao menos de longe, pois quando se chegava perto eram feias demais. Lembro disso porque era uma coisa que os soldados lamentavam o tempo todo.
Em uma das noites, como sempre de chuva, houve um ataque ao nosso acampamento. Estávamos em nossa barraca tentando nos aquecer, quando entra o aspirante e pede três voluntários para uma patrulha. Dois se oferecem, levantam-se e se equipam rapidamente, como bons soldados operacionais. Mais alguém acabaria se oferecendo, era um pelotão de soldados por vocação, mas o aspirante não deu tempo, olho em volta e me viu tentando se esconder e disse:
- Prado, pegue seu fuzil.
Fomos inspecionar o perímetro. Em um dos pontos, depois de rodas por toda parte sem achar nada, o aspirante resolveu voltar para o acampamento e comandou a volta em linha reta. Entraríamos no meio das barracas da cozinha do acampamento e os soldados cozinheiros abriram fogo contra nós. Tivemos que dar uma volta de 180 graus no acampamento para voltar sem ser fuzilados. Quando finalmente decidiu-se entrar no perímetro, avistamos um terceiro sargento com insígnias das forças especiais. O aspirante comandou:
- Alto lá. Qual a senha.
Mas o terceiro sargento o ignorou e seguiu seu caminho, como se nada tivesse ouvido. O aspirante olhou para nós, para verificar se alguém havia percebido carão que ele tinha passado e como não teve jeito de disfarça, eu já estava quase rindo, ele disse:
- Ele é forças especiais: embusteiro.
O terceiro sargento, forças especiais, fez igualzinho Ugo fizeram certa vez na Hora, no episódio em que o cabo queria lhe apresentar para as visitas civis ao batalhão. Se ainda não leu essa parte, pode ver em: A guarda. Naquele dia Ugo ignorou o cabo, assim como o sargento ignorou o oficial. Por sua vez, o aspirante agiu como o cabo, diante da indiferença. 
Não me lembro se foi no retorno destas manobras ou em outra, que passamos por Cascavel, no Paraná. Lá ficamos em um quartel que fazia fundos para outro. Durante a noite acordamos com um tiroteio, que logo silenciou. No dia seguinte ficamos sabendo que a guarda de um quartel costumava abrir fogo conta a outra. Diziam que não era de propósito, o que deixa a coisa pior ainda. Isso já parecia suficientemente absurdo, mas o absurdo completo aconteceu uns dias depois.
Acampamos nos arredores da cidade para desenvolve alguns treinamentos e certo dia saímos sob o comando do Sargento Mendonça. Faríamos uma patrulha rápida, buscando guerrilheiros, papel que poderia ser desempenhado por militares de outros batalhes da região. 
Escondemos o caminhão entre arvores fechadas e saímos para reconhecer o território. George e Joacir ficaram guardando o caminhão. Quando voltamos não tinha mais caminhão, nem os guarda nem coisa nenhuma. No chão ficou só as marcas dos pneus. De algum modo, um soldado de folga e desavisado, morador da região, passou por ali e foi detido pelos soldados que guardavam o caminhão, que suspeitaram que o recruta estava desempenhava um papel de guerrilheiro.
George lhe explicou sobre as manobras e que precisava mantê-lo preso, para averiguações, mas de algum modo ele fugiu e trouxe a guarnição do quartel de Cascavel, daquele mesmo que abriam fogo entre si de madrugada com munição, talvez para afastar o tédio. Prenderam Jorge, Joacir e o caminhão.
Para resumir – não conseguimos voltar para o acampamento em tempo de comer e, na volta, famintos, passamos por baixo de pés de laranja em uma chácara e o Sargento Mendonça confiscou as laranjas dos moradores, sem dar chance para que dissessem não, o que provavelmente não faria mesmo.

Os soldados do glorioso EB depenaram as frutas e até as folhas das arvores, de tanta forme.

[Ernande Valentin do Prado publica no Rua Balsa das 10 às 6tas-feiras]

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