Maria Amélia Mano
Aos que como eu,
buscam nos mapas dos dias,
pausas de encantamentos.
Aos lugares que ainda não fui.
Fome de tudo
- de
conhecer por dentro -
fome do miolo todo,
do bagaço,
da última gota de caldo.
João Guimarães Rosa
Corpo de Baile – 1965
Das mãos, o
jeito de carinho dar. O gesto de ir e vir. Chegar e partir, buscar. Desejo que
toma corpo, toma o copo de água. Alma que tem sede e tem fome. Incômodo insone.
Tranquilidade em sonho de seguir ainda. Em lugares não idos, em lugares de
voltar. Escutar, aprender, descobrir geografias e histórias de contar e
esconder. Segredos, canções, caminhos em dias, mapas e calendários.
Da garganta,
o seco do cerrado e a poeira quilombola do lugar ainda não ido, mas que ainda
vou. O sabor de rapadura do açúcar mascavo misturado com gergelim, vendido em
carrinho de mão na estrada de terra, vindo de longe, desse lugar que ainda vou.
Onde aterrissam as naves espaciais. Onde há coreto na praça. Julho e agosto. Bordado.
Planalto. Chapada.
Das plantas
dos pés grossos, danço o balanço da balsa que vai do rio ao mar, do dia à
noite, da areia ao céu e me presenteia com estrela distante na praia deserta.
Riso de criança correndo descalça. Nós duas. Aniversário. Dia de festa que
chega cedo. Noite de lua apressada. Água morna. Macio algodão da rede que
balança. Mais perto da África. Março. Luz de Lucena.
Do brilho
nos olhos, a umidade do chão banhado em lágrimas. Santos e rezas. São João de Barro.
Saia de chita costurada com linha e agulha nas mãos da criança. A terra
conquistada, a terra perdida. A terra pupila, ilha perdida no meio do mar do
olhar. Menina dos olhos. Se veste de coco e maracatu. Desenho em mão
mágica. Janeiro. Sonho de lugar não ido. Junho, quem sabe. Agreste.
Dos abraços,
braços em traços desenhados, coloridos de risos de crianças. Gerações.
Eternidades. Sementes. Meus olhos nos olhos dos filhos das minhas irmãs. Marrom
susto. Preto sonho. Janelas de corações e grito que corre e ri. Histórias. E
mais abraços, braços em traços que se penduram em mim. Esses traços, braços,
abraços sem fim. Carnaval. Fevereiro. Acordam tarde as montanhas verdes.
Do seio, do
ventre, o tronco da árvore que enlaço. Árvore de quintal de casa que
é mundo e viagem. Galhos que dão colo. Folhas que se despedem. Raízes que
insistem, mas que entendem que a semente tem asas. Que pólen é leve para
fecundar madrugadas e fazer vida nova. Sina de aventuras. Decantar o
aprendido em mãos, pés, garganta, olhos, abraços e seios. Todos os dias. Sopro. Pluma. Porto. Casa de
voltar.
Ilustração – Marina Faria
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