07 maio 2017

Andar no profundo [Julio Wong Un]


Para José Ivo dos Santos Pedrosa
Em agradecimento pelo cosmos de Parnaiba. 



Decidi hoje andar no profundo
Olinda vazia convidou-me
Passos lentos 
Pensamento solto 
Respirar profundo
Prestar atenção nos detalhes 
Nos detalhes dentro dos detalhes
Como um microscópio eletrônico sensorial.

Assim, apesar de por vezes me sentir ridículo, ou pior, esnobe, 
cumpri o prometido e andei vagarosamente por ladeiras espantos 
ensonhações nas moradas de 300 anos
Pelos raros objetos que me empolgavam 
Pelo olhar intenso de alguns 
Pela bondade da ângela que sonha sempre com o bem dos outros 
Que nos imagina reunidos pelo Amor
Mas o tempo que resta 
(pensei, na lentidão do profundo)
sempre será curto

Pouco é tudo 
Curto é eterno 
E o que tenho vivido nos últimos anos 
E mesmo nos últimos dez dias 
Vale vida inteira 

Meus passos diziam isto:
Fez muito faz muito fará muito
Mas tempo é variável imprecisa 
Se dorme e não se acorda 
Se beija e talvez seja a ultima vez
Por isso vale muito compreender quão sagrado 
É ter vivido isto tudo. Longa vida já 
Plena de momentos e processos mágicos 
Cidades bairros pessoas carícias beijos sonhos 
Amanheceres crepúsculos sóis intensos de meio-dia 

No mar da Barra Grande - Parnaíba
Flutuando como boia de borracha 
Ninado pelo mundo do meu amigo 
Agradeci por todo esse infinito a mim já concedido 
Por um olhar de ternura 
Por um quentinho de corpo de bebê
Por tempos de dedos milimétricos descobrindo peles e paisagens no escuro 
Por andaduras alegres com visões de futuro simples e sem complicações. 

No mar bondoso sendo atravessado pelo sal 
Eu compreendi o tanto que já vivi 
E que 
Daqui para frente tudo é oferenda sagrada
A ser recebida 
Como milagre cotidiano 
Sem desânimo sem aspereza 
Sem ironia sem pessimismo 

Nunca é tempo de morrer. 
Nunca é tempo de parar o inconcluso
Mas que bom que tanto fiz e tanto recebi
Mas que bom
Que a maravilha tunesca tenha me tocado

Assim se dorme e mesmo que não se acorde 
A obra estará já completa 
Em beleza 
Em transcendência 
Em mim
E nos que amo 


Olinda, 7 de Maio de 2017. 

[JWU publica quando pode]

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