Maria
Emília Bottini
Enquanto me
distraía lavando louça ao meia dia, a televisão estava ligada e as notícias
chegavam sem muita atenção. Mas uma, em especial, me chamou atenção. Uma
reportagem realizada com pacientes que estão em fase terminal da vida. A ideia
era muito simples a de permitir aos pacientes a realização de seus desejos. Me
comoveu a simplicidade dos desejos. Talvez quando estamos diante da morte,
poucas coisas realmente importam, talvez apenas o que gostamos e temos afeto
permanece conosco.
Um rapaz muito jovem com câncer desejou um
hambúrguer com batatas fritas.
Uma mulher com deficiência visual, causada
pela diabete, devorou sua sobremesa favorita.
Um idoso recebeu a visita de seu cachorro que
abanava o rabo ao dono acamado.
Uma avó é envolvida em um abraço por seus
netos ainda crianças.
Mas o que me comoveu mesmo foi um senhor que
com mãos magrinhas saboreava uma taça de vinho tinto. Imaginei como foi delicioso
sorver este líquido depois de tantas proibições.
Após a reportagem
fiquei pensando na quantidade de vezes que realizamos determinadas ações no
piloto automático sem nos darmos conta que são únicos e sem repetições.
Estes pacientes
têm desejos simples e corriqueiros. Ver seu cachorro, estar com os netos, comer
sobremesa ou lanche favorito e beber uma taça de vinho. Quanta simplicidade
nestes desejos e quantas alegrias produziram.
Sabemos que todas
esses desejos não irão modificar o curso natural e evolutivo de suas doenças,
mas as aproxima da morte com um tom de último desejo realizado, de sabor do
gosto da vida e a importância das pequenas coisas.
Na corrida do
movimento da vida nem sempre é possível pensarmos sobre nossa finitude que
lentamente se aproxima, mas seria interessante de vez em quando refletir sobre
esse tempo que chegará para nós também. Parece mórbido. Não percebi tal
morbidez na reportagem, assim como não percebo ao pensar sobre isso.
Sei que não
queremos morrer, mas já que isso nos ocorre, que o que gostamos de comer e
beber (quando possível) não esteja afastado de nós. Portanto, é importante
aproveitarmos o sentido dos alimentos e das bebidas que gostamos, pois doenças
nos chegam sem que a desejamos.
Esses dias
comentei com meu marido que eu desejaria comer strogonoff, arroz, batata palha
e meu refrigerante favorito guaraná antártica, não poderia ser outro. E uma
sobremesa que tenha morango. Minha refeição favorita seria esta. E gostaria de
estar com pessoas que acrescentaram minha vida de sentido que são alguns poucos
amigos e familiares, ninguém mais.
Aproveitar
enquanto estamos por aqui as pequenas e grandes alegrias é o que observei
nestas pessoas que ainda estão vivas e lhes foi permitido seus pequenos
prazeres. Talvez devêssemos olhar mais para isso e menos para outras coisas que
distraem o olhar empobrecendo o sentido do viver.
[Maria Emília Bottini publica no Rua Balsa das
10 aos Sábados]
Nenhum comentário:
Postar um comentário
O que tem a dizer sobre essa postagem?