Maria Amélia Mano
Só
no ato do amor -
pela
límpida abstração de estrela do que se sente -
capta-se a incógnita do instante...
Clarice
Lispector
Cidade
em quarta qualquer, manhã mínima, primavera anônima. Hoje, Clarice, procuro a
essência da vida em teus poemas. Pra isso, dei de olhar invisíveis instantes. Infinitos
instantes.
Casal
idoso de cadeira de rodas passeia nas ruas de mãos dadas. Ele pode andar, mas
comprou cadeira só pra acompanhar a amada. É instante suspenso que se deseja
longo. E tudo que alonga tempo de mãos dadas, vale apostar. Vale sonhar, caminhar,
mesmo que de outro jeito.
Ônibus
tem cantoria. Cobrador faz sessenta anos e, sem folga, quer comemorar.
Viajantes rotineiros fazem festa surpresa. É instante suspenso que se deseja
longo. E tudo que alonga tempo de alegria e partilha vale acontecer. Vale ser e
enternecer, mesmo em movimento, expectativa, atenção.
Criança
com seus oito anos deita com mãe na grama do parque. Pálida, não tem cabelos
nem sobrancelhas. Usa lenço na cabeça. É instante suspenso que se deseja longo.
E tudo que alonga tempo de vida que não se sabe quanto, vale sorrir. Vale
existir, resistir, mesmo com medo, dúvida.
Encontros,
trajetos, esperanças, relógio que se deseja abrandar, enganar. É solidão e
multidão que passa e insiste: instante, incógnita. E te releio, revejo e
revelas que segredos e magias não estão somente no tempo suspenso. Que o que
alonga e torna imenso o ínfimo é o que se sente.
Cidade
em quarta qualquer, manhã mínima, primavera anônima. Hoje, Clarice, encontro a essência
da vida em teus poemas. Pra isso, dei de olhar invisíveis atos de amor. Infinitos
atos de amor.
Texto para a Oficina Santa Sede Mosaico
É o instante do infinito e o infinito do instante! Lindo, Amélia
ResponderExcluirinfinitamente obrigada!
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