Maria Amélia Mano
Ainda não sou tão caprichosa pra me render ao vento de
revoada renovada.
Ainda não sou tão obediente pra seguir rotas de pássaros.
Ainda não sou tão outono pra farfalhar com as
folhas amarelas.
Ainda não sou tão satânica pra ser expulsa do paraíso com
serpente.
Ainda não sou tão
inocente pra feitiço em tumbas, encruzilhadas.
Ainda não sou tão santa
pra verniz fosco, sutiã bege e evitar cachaça.
Ainda não sou tão sóbria
pra esgrima, divã, evitar dúvidas, dívidas e drogas.
Ainda não sou tão ébria
pra poemas, haicais boêmios na madrugada.
Ainda não sou tão medusa
pra empedrar, paralisar com olhar.
Ainda não sou tão medrosa
pra usar véu, máscara nos olhos e armadura.
Ainda não sou tão brisa
pra contar e cantar cio da terra, cor de terra.
Ainda não sou tão lume
pra dourar temperos e temperança, temperatura.
Ainda não sou tão trégua
pra vagar, fugir, gemer e inventar tempos.
Ainda não sou tão relva
pra mimetizar a lanugem na tua nuca.
E de todos os aindas,
esse último, é único e o único que me enternece.
Por me obrigar a ser
promessa, semente, preliminar.
Por me fazer refém da tua
presença. Sempre.
Ilustração: Rie Nakajima
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