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Mar de riscos. Alice, 2017. |
Ernande
Valentin do Prado
A enfermeira
entrou no quarto com o antialérgico. O pai aproveitou para avisar que o soro
estava acabando.
- Falta menos de
um dedo...
Disse ele
apontando para o frasco pendura em uma haste de metal inoxidável na cabeceira
da cama.
- ... tenho medo
que acabe e entre ar no equipo, depois dá trabalho tirar, além disso tem sempre
o risco de demorar e perder a veia.
A enfermeira,
com a bandeja na mão, olhou de longe, sem paciência e querendo sair do quarto.
Disse:
- Quando o soro
está acabando a bomba apita.
O pai insistiu,
explicou que a bomba estava sem programação para apitar desde o dia anterior,
que por isso ainda não tinha apitado. A enfermeira, com ar de: não aguento
gente ignorante querendo ensinar meu trabalho, fingiu que olhou, já com o pé
para fora do quarto e também insistiu:
- Quando o soro
estiver acabando a bomba vai apitar.
O pai da menina
de olhos amarelos caminhou até a porta, pegou delicadamente a enfermeira pelo
braço e levou-a até perto do frasco quase seco e insistiu:
- Olhe, está
acabando, não está?
Ela olhou ou
fingiu que olhou e repetiu:
- Pode deixar, a
bomba vai avisar quando estiver acabando.
Saiu do quarto,
não voltou com outro soro, como o homem achou que aconteceria. Em alguns
minutos o soro acabou, a bomba começou a apitar por estar com o frasco seco,
não para avisar que o soro estava acabando.
O pai caminhou
até o posto de enfermagem e voltou para o quarto, já de cabeça quente. Uma
Técnica de enfermagem, depois de um tempo de espera que pareceu longo, entrou
no quarto, olhou o ar entrando pela parte superior e o sangue retornando na
parte inferior do equipo e advertiu, olhando para o pai como se ele fosse
relapso, desinteressando e sem responsabilidade:
- Pai, tem que
avisar quando o soro está quase acabando ou entra ar no equipo...
O pai nada
disse. Engoliu seu desgosto enquanto pensava que realmente era verdade o ditado
popular: “se correr o bicho pega, se ficar o bicho come”. A técnica de
enfermagem continuo seu discurso para catequisar o pai sem responsabilidade:
- ... quando a
máquina apitar tem que avisar logo, pai.
O homem pensou
em dizer que não era pai dela, mas se conteve e apenas repetiu, mas sabendo que
não seria ouvido:
- Essa máquina
não apita desde ontem...
[Ernande Valentin do Prado publica no Rua Balsa das 10 às
6tas-feiras]
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Partes a publicar:
6 Respeito
7 Enfermeiras
8 Cuidada
9 Contrabando
10 Brinquedoteca
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5 Regras
6 Respeito
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8 Cuidada
9 Contrabando
10 Brinquedoteca