— Você é o
enfermeiro?
Disse o homem de mais ou menos um metro e setenta e cinco, barba
sem fazer há uns dias, o que lhe dava uma aparência cansada. Os olhas eram
tristes. Na mão segura uma receita com anotações.
— Sou eu...
Respondi estendendo
a mão.
— A moça da
recepção disse que eu deveria falar com o senhor...
Seu Carlos entregou
a ficha de acompanhamento com anotações de valores de pressão arterial de vários dias. Todas alteradíssimas. Depois mostrou meia dúzia de receitas com diferentes
medicações.
Ele contou sua
história, quer dizer, contou a história da doença. Detalhou a escalada dos
valores da pressão arterial, cada vez mais alta e descontrolada. Falou de todos os
remédios que estava tomando, de todos os exames que já tinha feito, de todos os
médicos de família que já tinha consultado, dos diferentes especialistas, das diferentes medicações e doses que já tinha experimentado.
— É só isso, seu
Carlos?
Disse eu, esperando
algo mais. Porém ele não respondeu de imediato. Levou um tempo, que não deve
ter sido tão longo, mas que sempre parece mais constrangedor do que realmente
é. Então insisti.
— ...não tem mais
nada, Seu Carlos?
— É só isso...
Disse o homem,
olhando para o chão.
— Talvez não tenha
nada que possa me contar agora, Seu Carlos, mas se veio falar comigo, depois de
tudo que já fez, deve ter mais coisas que ainda não falou com ninguém, concorda?
Ele não respondeu
de imediato. E eu esperei, dando tempo para que o homem pudesse finalmente
contar (e entender) o que fazia sua pressão se alterar. Finalmente
ele levantou a cabeça e disse:
— Eu era
caminhoneiro...
E quando terminou
de contar sua história, depois de uns trinta minutos, eu apenas fiz uma
pergunta retórica.
— Agora o senhor
compreendeu porque a pressão não quer baixar?
— Compreendi.
Respondeu Seu
Carlos, agora de cabeça erguida.
— Posso fazer mais
alguma coisa?
— Hoje não...
— Então vamos medir novamente a pressão e na semana que vem o senhor volta para gente conversar, pode ser?
— Então vamos medir novamente a pressão e na semana que vem o senhor volta para gente conversar, pode ser?
[Ernande Valentin do
Prado publica no Rua Balsa das 10 às 6tas-feiras]