Maria Amélia Mano
Entro na sala de
coleta de exames do hospital pra acompanhar seu José, sem documentos, situação
de rua. Poucas cadeiras enfileiradas em uma parede. Só uma senhora sentada. Do
outro lado, nichos, salinhas de coleta separadas de nós por cortina branca. Todos
de máscara. Coletadores paramentados em tempos de Covid.
A coletadora da
salinha 1 chama seu José e confere dados. Nasceu em 15/12/70? Seu José confirma
e prontamente falo: sagitariano! Seu José me corrige: capricorniano! Explico
que Capricórnio é depois. Seu José informa que foi registrado dia 15 mas é do
dia 24. A senhora que também aguarda na sala diz que o filho é capricorniano e
é maravilhoso. O coletador da salinha 2 diz que bom é Touro. A coletadora
gordinha da salinha 4 pula: só porque é o teu! A da salinha 3 avança um passo
balançando um tubo de sangue: só sei que Gêmeos é o fim! Sou de Gêmeos e nem eu
me aguento! A provável dona do sangue que a geminiana balançava sai da salinha
3 e provoca: dizem que ruim é Escorpião... O coletador da salinha 2 afirma com
a cabeça e diz que é o pior. A gordinha da 4 pula de novo: só porque tua mulher
é de Escorpião! Suspeito que se conhecem mais.
Seu José sai da
salinha 1. Vejo os olhos sorrindo por detrás da máscara da senhora que também
espera. Aliás, vejo os olhos de todos sorrindo por detrás das máscaras,
inclusive os da fila. Capricornianos são especiais, repete a senhora, meu filho
é capricorniano. E eu penso: especiais são essas pequenas coisas leves que nos
unem.
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