DEVER CUMPRIDO
Ah! Foram anos e anos de fazer companhia, roer
sapatos, sujar roupas no varal, e até fazer uns rasgões em algumas, muitos anos
de latir para passarinho, vizinho, folha e sombra... Agora a sensação de dever
cumprido se confundia com o desejo de sonecas tranquilas, de boa comida, de
poder apreciar o caminhar das formigas de usar restinhos de energia para uma
vez ao dia tocaiar e correr atrás das galinhas no quintal. Pena que as crianças
da casa não concordassem com seus desejos. Vinte vezes por dia adormecia para
levar um susto com elas correndo e gritando perto de seu corpo largado no chão.
Pena que nem sempre entendessem que aquele exercício matinal de suas pernas
reumáticas não era de verdade com intuito de pegar as frangas, era um lampejo
de forças que vinha e ela não fazia questão de conter. Na idade de gente era a
mais velha da casa, segundo o veterinário rondava os 100 anos... merecia que
lhe deixassem fazer o que bem entendia, fosse entrar na casa e deitar no tapete
branco mesmo estando imunda de deitar na lama, fosse rasgar papéis dos desenhos
das crianças ou passar sobre a roupa a quarar, ou mesmo deixar suas pegadas na
varanda recém lavada.
Boa praça, não ia reclamar de nada não. Sua “altiva
dignidade” não faria tal papel. Seguiria ignorando as pequenezas humanas e se
voltaria para dentro tirando mais uma soneca na grama sob a goiabeira... até as
crianças chegarem para subir na árvore. E tenho dito!
Maria Lúcia Futuro Mühlbauer
Publica às
segundas-feiras
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