Dia de Finados
MORREU? MORREU! ANTES ELE DO QUE EU!
Quando vieram me dizer que o falecido havia batido as botas,
que fora comer capim pela raiz e que tinha ido para o Beleléu a minha ´primeira
reação foi de que ao menos eu estava vivo! Claro que logo me bateu uma pontinha
(bem pequena) de culpa, Nossa! Eu me disse, que coisa feia dizer que melhor que
o outro seja o morto! Enrubreci envergonhado,
pois ainda tenho estes arroubos de pejo, e respirei fundo a perguntar o que
sucedera. Recebi a explicação que tinha passado desta para a melhor devido ao Câncer
de pulmão associado ao COVID 19, que a família ficou “sentida’, mas aliviada,
pois enfim descansou. O último ano havia sido de grandes sofrimentos com a
doença original e as complicações das metástases e tratamento. Ninguém sabia como
pegara COVID. Por este motivo, nem ia poder ser velado e enterrado com a presença
dos amigos mesmo que o enterro caísse hoje, dia de finados.
Condolências e pensamentos confusos permearam a conversa
depois disto. Minha vergonha foi desaparecendo com a culpa mínima e foi vindo
uma gratidão para mim “egoísta” de sobrevivente. Mais que máscara e cuidados
higiênicos e sociais veio a “revelação” de que eu não havia sido escolhido para
morrer ... ainda. Que tinha um compromisso de vida e com a vida minha e alheia.
O informante da desdita deve ter achado que enlouqueci pois abri os braços como
em louvores, ri comigo mesmo e pareci alegre. Caí em mim e comentei que era uma bênção e uma
tristeza a morte de alguém em tal sofrimento. Escutei os elogios (mais que
merecidos) ao defunto, o quanto foi rico em amizades, farto na distribuição das
suas alegrias e responsável no seu trabalho. Um pouco mandão, sim, mas um cara
bom com a família, e companheiro de trabalho cooperativo e ativo. Tá, fumava
muito desde a infância, e talvez o câncer tenha cobrado sua parte neste vício,
mas saber que foram 2 anos sofrendo cada dia mais de certo modo anunciava que o
fim seria para dar alívio. Lembrei da avó da minha mulher... de como sofreu e
sofremos junto com ela.
Depois disto me peguei pensando no significado de se celebrar
o dia dos mortos. Em alguns lugares há mesmo festa, em outros renovação de
luto... e então refleti com meus botões, bem que vale celebrar os que nos
precederam e nos permitiram estar aqui, vivos! Que sejam benditos os
ancestrais!
Maria Lúcia Futuro
Mühlbauer
Publica às segundas
feiras
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