NÃO VALE UM TOSTÃO FURADO
Cansou de escutar as pessoas dizerem
isto dele. Era malandrinho sim, fazia mil diabruras, quebrava janelas chutando
bola, brigava na rua, roubava sobremesa, assustava gatos e cachorros e imitava
toda e qualquer voz que escutasse. Sabia assoviar muitos cantos de passarinho, ganhava
muitas bolas de gude nos jogos do campinho e adorava aprontar confusão. Mas achava que
valia sim, pois ele sempre carregava sacolas pesadas para s avós da rua,
ajudava na limpeza das varandas de quem não tinha filho para ajudar ( na casa dele
eram 8 irmãos que faziam muitos dos serviços, não precisavam dele).
Cresceu considerando a frase injusta e se
perdeu da vizinhança na vida de estudos e de trabalho na cidade grande. Passou
o tempo e ao retornar já homem feito olhou o campinho dos jogos de gude e de
futebol, lembrou das janelas quebrada, das flores roubadas nos jardins da
vizinhança, das vassouradas nas varandas da D. Flor que sempre tinha uma janela
com vidro quebrado e lembrou que ele, o menino levado da família Couto fora o
único que “não valendo um tostão furado” se arriscou a mudar o rumo dos meninos
da rua e ir estudar fora.
Descendo pela calçada ficou
imaginando se o reconheceriam limpo e de calças compridas, riu para dentro. E
nisto deu um esbarrão num outro homem da sua idade. Parados, se olharam enquanto
se desculpavam, mas não seguiram adiante. Um tipo de reconhecimento foi
brotando até que que o outro gritou
entusiasmado: TOSTÂO! Depois de abraços e risos continuaram o caminho descendo
a rua rumo ao antigo lar. O casamento da irmã era o motivo da visita à família
e a rua toda estava alvoroçada. A caçula casava com um dos meninos dos jogos de
bola. Ele ia rever a todos depois de
quase 15 anos fora! Primeiro no ensino profissionalizante técnico da cidade grande,
depois numa faculdade na capital do país e a especialização na Coreia. |Todo o
tempo falando com todos virtualmente e recebendo as visitas de quem podia ir, mas
sem voltar em casa.... Muito pouca mudança na estrutura da cidade, nenhuma
mudança nas casas da rua...
Chegaram no portão e o colega tornou
a subir a rua enquanto Tostão entrava pelo portão sem bater nem tocar campainha:
queria surpresa e conseguiu. Chorou a mãe e o pai ficou pigarreando, os 2 irmãos
presentes gritaram logo e ai já vale ao menos um tostão furado? Seu peito se
inflou de afeto, sabia que agora seu valor como pessoa não era medido em tostões,
reais, cruzeiros, euros ou dólares, mas sabia também que, com seu trabalho,
ganhava mais, num ano, do que o valor
daquela casa. Entre abraços e beijos riu do apelido de Tostão... Vai que o
chefe na companhia ficava sabendo disto KKKKK
Maria Lúcia Futuro Mühlbauer
Escreve às segundas
feiras
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