Cá estou eu, no sul da França. Perto do mar, mas longe demais para vê-lo. Interior francês charmoso de montanhas, platôs e queijo Roquefort. Decidi entre vários lugares badalados e grandes centros do velho mundo para passar as festas do final de ano ajudar uma família de camponeses que produzem produtos orgânicos aqui. Apesar de todo o charme, é difícil levantar de manhã em uma casa sem calefação.
Entre muitas coisas incríveis, uma delas e lavar os pratos quebrados repetidas vezes enquanto fabricamos chocolate artesanal. Aqui se um prato quebrar no final do dia pega-se cola e cola-se pedaço por pedaço, caco por caco até o prato ficar “inteiro” novamente, reconstruído. Claro, com as “cicatrizes” da colagem. No dia seguinte almoçamos no prato refeito. Dificilmente algo vai para o lixo, tudo é reutilizado, refeito, reciclado.
Penso na medicina dos pratos quebrados, do quebrado ou do que foi quebrado. Nessa medicina incompleta do cuidado. De pegar cola no final do dia e juntar os pedaços, refazer os pratos, repensar a saúde. A dona da casa me mostra alguns pratos que já quebraram várias vezes e que no final do dia voltam ao formato original. Acontece de escorregar da mão e cair, mas no nosso mudo moderno a resposta imediata é a lixeira.

Voam abraços,
Mayara Floss
[Mayara Floss publica na Rua Balsa das 10 às 4as-feiras]