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Imagem capturada na internet. 2017 |
Ernande Valentin do
Prado
- Tomei uma dipirona,
achei que estava com febre.
Disse Cátia, sorrindo,
sem dar importância demais.
- E por que não tomou
só um banho?
Perguntei eu, com minha
objetividade de enfermeiro que não gosta muito de medicações.
- E dava?
Respondeu ainda
sorrindo, Cátia, e continuou explicando e gesticulando:
- ... eu estava sozinha
com Sofia. Minha mãe e minhas irmãs tinham saido, estava sozinha e ela não me
deixa. Era só afastar um pouquinho e ela abre a boca. Fui conseguir tomar um
banho só quando minha irmã chegou, mais de uma hora.
Ela falava sorrindo, só
contando, não tinha lamento, dúvida, arrependimentos. Nós dois na porta da
Unidade de Saúde, eu por não encontrar o que fazer, ela esperando a Médica, de
novo atrasada mais de duas horas.
- Meus peitos estão tão
cheios, chega escorrer.
Cátia é uma adolescente
de 17 anos, mais ou menos um metro e cinquenta. De aparência dá para ver que o
peso ainda não voltou ao normal pré-gravídico. Ainda tá gordinha, a barriga levantando
o vestido apertado. Sofia nasceu há mais ou menos sessenta dias. Parto normal. Veio
a UBS por causa de uma virose, disse ela. Sente-se com febre, uma tosse chata
que faz a garganta queimar. Por conta própria tá tomando lambedor, dipirona e
um xarope para tosse que tinha em casa. Será que continuo tomando, perguntou
ela.
- Tá usando o
absolvente embaixo do sutiã?
Perguntei, apenas para
continuar a conversa.
- E não tô? Olha
aqui...
Disse a menina recém
mãe, mostrando o absolvente embaixo do sutiã, para evitar molhar o vestido.
- Sofia trocou o dia
pela noite.
Continuou contando
Cátia com o sorriso cada vez maior, ao falar da filha.
- ... dorme o dia todo,
de noite não prega os olhos. Estes dias era meia noite e ala acordada, com
aquele olhão em cima de mim. Depois dormiu um pouco e acordou antes de uma
hora. Eu que não durmo mais...
No rosto da mãe aquele
sorriso tão elegante, tão sincero, tão feliz que até ofende o saber profissional sobre
adolescentes mães. Cheguei a me perguntar de onde vinha tanta força, tanta
determinação.
Sei não. Existem razões
biofisiolágicas e sociais que explicam porque adolescentes não deveriam ser
mães, mas existem outras que explicam porque algumas se saem tão bem.
Nem todas a gente entende.
- Às vezes Sofia chora
sem razão...
Continuo falando Cátia.
- ... já mamou, tá
limpinha, sequinha, mas chora. Aí eu falo com ela, apareço e ala se acalma,
passa tudo.
[Ernande Valentin do Prado publica no Rua Balsa das 10 às
6tas-feiras]
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