Ernande Valentin do Prado
Tenho pra mim
que nunca quis muito da vida. Isso é bem verdade em termos financeiros: desde
os 12 anos que tenho vontade ter minha casa própria – via o quanto era sofrido
para meus pais pagar aluguel – mas fora isso, não tenho grandes sonhos
materiais (confesso, gosto de boas meias, mas calça não me importo de comprar
na feira). Nunca quis carro, moto, roupas de marca, como meus colegas. Meus sonhos
não envolvia o ter, era mudar o mundo, salvar a América, coisas simples assim.
Também não sou
de reclamar do que tenho ou de onde estou – reclamo e muito (até) de outras
coisas, não das minhas escolhas, principalmente aquelas que me levaram para
longe de minha família de sangue, de amigos importantes em minha vida, alguns
que os atuais nem sabem que existem, como o Ari Roque, de meus tempos de
adolescente no Pirapó, distrito de Apucarana, no Paraná, um cara que amo muito
e sinto falta todo dia. Do Antônio (Toninho), meu amigo quase irmão em Fazenda
Rio Grande. Foi meu professor de Filosofia no segundo grau, depois companheiro
de militância (quando achavamos que iriamos mudar o mundo pela política
partidária). O Adilson (que ora por mim em sua igreja para compensar minha
pouca fé), o Altair, do curso de Enfermagem. Sinto muita falta de todos eles
(que aqui citados simbolizam várias outras pessoas dos mesmos períodos e lugares).
Como o Junior, o Ademar, o Ronaldo (três padrinhos de Alice), a Priscilla
(madrinha de Alice), a Estela (com quem divido sonhos e dores), o Rodrigo dos
tempos de Mato Grosso do Sul e Escola de Saúde pública (que abriu a casa de sua
família para ser um pouco minha). A Cíntia no Espírito Santo. Todos foram de
alguma forma minha família nestes lugares e carrego comigo no coração.
Por onde passo
conheço pessoas maravilhosas que (longe de deixar) carrego comigo e vão se
somando a imensa riqueza que é minha vida.
Minhas escolhas
levaram-me a deixar o Paraná assim que conclui a graduação em Enfermagem (um
sonho louco de mudar o mundo pelo cuidado). Deixei um concurso na Universidade
Federal do Paraná, depois na Prefeitura Municipal de Curitiba, Campo Largo e o
último na Secretaria de Saúde do Estado do Paraná. Depois nunca mais passei em
concurso e acho que estão cada vez mais difíceis e sem sentido. Vou por aí
trabalhando ora como bolsista, ora como CLT ora nestas prefeituras que não
respeitam nada e nem ninguém. Inseguro, sem futuro e faz com que eu seja de
fato um trabalhador cigano (meio circense como gosta da imagem Larissa), mas
foi a escolha que fiz para não me tornar como algumas pessoas que via e vejo
por aí, sem fé, sem vontade de ser mais, sem esperança.
Ontem deixei
mais um lugar. Mas antes de dizer como sai, preciso dizer como cheguei.
Quando sai do
Mato Grosso do Sul fui para Paripiranga, onde fiquei 4 anos lecionando em uma Faculdade de Enfermagem. (lá também deixei pessoas lindas das quais tenho muita
saudade). Quando sai do centro oeste havia prometido nunca mais trabalhar em uma
Prefeitura, pois não suportava a ideia de não ter meus direitos respeitados e,
perdendo o emprego, fato que sempre acontece, fazendo ou não um bom trabalho, a
gente sai com uma mão na frente e outra atrás e, o pior, tudo que plantou é
arrasado em nome de uma burrice política inconsequente e estúpida (no mínimo)
de apagar a história. Vejo essa desonestidade até em movimentos que se dizem
democráticos e progressistas de emancipação do homem (pode uma coisa dessas? –
mas isso é outra história)
Em janeiro de
2013 sai da faculdade onde fiquei por 4 anos. Como já trabalhava como Bolsista
na Universidade Federal de Pelotas (UFPel), curso de Especialização em Saúde da
Família (onde reencontrei Seiko, dos tempos de Faculdade e incorporada a
família que vai crescendo), fiquei na cidade recebendo o seguro desemprego e me
preparando para novos desafios. Neste meio tempo preparei-me para ir (ou vir)
para Paraíba. Cheguei a visitar a cidade, procurar casa para alugar e marcar a
data da mudança, mas eis que entra em minha vida uma pessoa chamada Yanna
(coordenadora de Atenção Básica). Ela ligou de Dias D’Ávila querendo conversar.
Disse que recebeu indicação de um colega (Silvio Medina), que não conhecia
ainda, mas que havia recebido uma indicação de Letícia Falleiros, Gaúcha
radicada na Bahia, e uma das autoras no livro Vivências de educação popular na
atenção primária à saúde com o texto: Experimentando a extensão popular,
página 115.
Lembrei-me que
havia prometido não mais trabalhar em prefeitura (ao menos sem concurso), mas
quando se está desempregado tudo é aceitável e fui falar com ela, mas na
certeza de recusar.
Fui recebido tão
bem, com tanto respeito e consideração pela minha história, pequena, mas
considerável. Yanna e Rafael, Coordenadora de Atenção Básica e Gerente de
Atenção à Saúde, falava em nome do Secretário de Saúde, Fabiano Ribeiro.
Contaram-me que era um “time”, uma equipe que já trabalhavam junto e dividiam
sonhos há algum tempo. Convidaram-me e convenceram-me a aceitar uma vaga como
Apoiador Institucional nesta equipe de “militantes” e fiquei na cidade por sete
meses. Aprendi muito, gostei muito, conheci muita gente (comprometida com a
população, militante de verdade em prol de um SUS que ainda existe em poucos
lugares e, sobretudo, conhecedores de gestão e APS). Ganhei família nova e mais
uma vez parti. (Esse trecho dá um capítulo à parte, para não ser injusto com
Lucimar, Dona Lú, Cíntia, Graça, Rafael, Fabiano, Rafaele, entre outros).
Ontem cheguei à
Paraíba. Estou em Lucena (de frente para o mar) região Metropolitana. Para
chegar até João Pessoa, como quase todo mundo faz aqui, leva duas horas, fora o
sofrimento, mas também tem poesia, basta saber olhar, ouvir, sentir. Estou bem,
estou satisfeito (volto ao tema depois, para não ser injusto).
Apesar da
saudade, reclamar pra que?
[Ernande Valentin
do Prado publica no Rua Balsa das 10 todas às 6tas]