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Fonte da foto: internet. |
Ernande
Valentin do Prado
A
visão de um bando, com bandeiras
azuis com números dentro, prontos para invadir uma comunidade, que no resto dos
dias passa abandonada, achincalhada e que seus moradores viajam nos piores
entre os piores ônibus públicos de João Pessoa, fez me lembrar dos versos da
música de Bezerra da Silva:
“Hoje
ele pede seu voto
Amanhã
manda a política lhe bater”
Essa
comunidade ocupa uma faixa nobre próximas da orla de João Pessoa. Todos os
outros pontos, nesta mesma faixa, já foram ocupados por prédios de alto padrão,
que estão no imaginário da elite Branca[1], que possivelmente sonha
com uma remoção dos moradores, preferencialmente em uma ação policial violenta na
madrugada.
Quase
sempre tem um juiz (elite branca) disposto a dar autorização, não é mesmo?
Mas
nesta época todo mundo conta. Cada pessoa um voto. E na comunidade eles devem
ser bem mais baratos do que em outros locais da cidade. Isso parece ser o suficiente
para explicar porque as pessoas que têm horror em adentrar nas ruas e vielas
mal cheirosas daquele lugar, durante todos os dias dos anos que não têm
eleições ou que não se pode fazer campanha, nesta época invadem a comunidade
com bandeiras e santinhos nas mãos e sorriso nos rostos.
Levam
muitas promessas em nome de seus patrões, mas os moradores já sabem ser mentiras
arrumadinhas. Fingem acreditar, mas no final das contas querem saber quanto é
que vão levar para votar e apoiar o “canalhocrata” do dia, como diria mestre
Bezerra da Silva.
É
fato, neste sistema eleitoral que atende perfeitamente as necessidades,
materiais e espirituais, das elites brancas, o voto não é dado, mas vendido.
Francamente: vender o voto é, quase sempre, a única forma de garantir receber algo
dos políticos (que depois vão mandar a polícia para negocias as políticas
públicas). Quem acredita que não é bem assim talvez nunca tenha andado pelas
ruelas das comunidades do Brasil (que antes se chamavam favela).
O
fato de não saber em quem acreditar, ou (correndo o risco de uma obviedade burra)
não pode acreditar em nenhum candidato, serve, entre outras coisas, para
justificar porque não existe mais o jogo de convencimento, que já existiu um
dia, entre candidatos e eleitores. Hoje o que acontece é uma negociação
comercial na cara dura.
-
Quanto me dá pelos meus votos?
-
Quantos votos tem em sua casa?
Por
exemplo (sempre gosto de exemplos): nas eleições municipais passada estava na
Bahia. Um determinado candidato a vereador quase perdeu a esposa, porque no
final das eleições só restou, em sua casa: o fogão (que a mulher se recusou a
doar em troca dos votos, ameaçando abandona-lo) e parte do telhado da cozinha.
O resto tudo deu pagando os poucos votos que teve.
Por
outro lado, não sei se aceito tão bem o argumento de que é impossível existir
políticos e governos honestos com um povo tão antiético quanto o brasileiro.
Pode até ser verdade, mas também esconde a necessidade das elites brancas se
justificarem, nem que seja a Deus ou a suas consciências (se é que têm), diante
do sistema que aqui montaram e administram desde sempre, ora com este ora com
aquele outro partido (que dá no mesmo).
No
Brasil (correndo o risco de estar fazendo chover no banhado, com essa fala) as
instituições são corruptas (tanto faz se púbicas ou privadas, do executivo,
legislativo ou do judiciário e, pasmem: até as instituições religiosas não
gozam de boa fama).
Essas
instituições são dirigidas ideologicamente pelas elites financeiras (que
realmente detêm o poder, não importa qual o partido à frente ou atrás da mesa
presidencial). São corrompidas desde que aqui chegaram, vindas da Europa,
trazendo armas, espalhando discórdia, ódio e levando ouro, açúcar, pau Brasil.
Enfim, parece um obvio ululante dizer que são elites mal intencionadas e
corrompidas até a pleura, como diria o bom Sargento Borba (orgulho da direita
tupiniquim).
Ainda
hoje os governos, o estado e suas instituições (na ânsia de centralizar o
poder), são organizados para impedir que as vozes dos honestos (e do povo em
geral) sejam ouvidas ou que tenham algum peso nas decisões públicas. A voz das
classes populares, certas ou erradas, não contam quase nada no dia-a-dia.
Quando se vê o grau de corrupção das instituições públicas e privadas deste
país, dá para dizer: “se o povo fosse tão corrupto quanto, não teríamos mais
nação, nem teríamos como sair à rua sem sermos esfaqueados”.
Por
exemplo, as instituições brasileiras organizaram o processo eleitoral
(inclusive com a participação do judiciário) de uma forma que Partidos (quase
todos corrompidos) escolhem candidatos (quase todos mal intencionados) sem
necessidade de participação popular.
A
mesma coisa pode se dizer dos sindicatos (quase todos eles não precisam dos
trabalhadores para se manter financeiramente e menos ainda para deliberações).
Acho até que preferem assim, fica mais fácil negociar e tomar decisões sem
tanta gente dando opiniões, fiscalizando os atos da diretoria e lhe chamando de
pelegos.
Até
o controle social no Sistema Único de Saúde, tão bem desenhadinha pela leio
8.142/90 e defendido com unhas e dentes por quem se diz favorável a um sistema
de saúde público e de qualidade com a participação popular, é feito sem a real
participação popular (não porque não queiram, mas porque é perda de tempo,
sabem que quase nada que debaterem contará para a decisão final, que é do dono
do mandato ou de alguém designado por ele).
A
população só pode votar, no processo eleitoral, entre os candidatos escolhidos
pelos partidos. E se os partidos têm processos de escolhas baseados no
oportunismo, no ganho financeiro, nos esquemas múltiplos, na troca de favores,
toda escolha feita pelo eleitor será errada, ou estou errado?
Isso
parece muito mais uma armadilha do que uma democracia.
Em
quantos candidatos o eleitor realmente pode confiar? E se o eleitor desconfiar
de todos os candidatos apresentados pelos partidos e financiados pelos
empresários (quase sempre tão ou mais mal intencionados do que os partidos),
faz o que?
Se
votar, neste sistema, vota errado. Se anular o voto é chamado de alienado.
Votar em outros, que não foram escolhidos pelos partidos, não pode e mesmo que
pudesse, quem saberia que são candidatos, sem o financiamento de campanha dos
empresários?
Será
justo a população, refém desse sistema, ainda ser chamada de corrupta, de
responsável pelas escolhas das elites financeiras e culturais (corruptas, quase
todas) e pelo estado (em essencial corrupto, pois é a expressão das elites)?
Pode
até ser verdade que o povo é corrupto, mas parece ser um comportamento
aprendido com as elites corruptas, ou seja, é um exemplo que vem de cima e não
se aplica a maioria de nós.
Talvez
essa seja uma “verdade” tão absurda que o melhor é ignorar ou desacreditar, do
contrário, fica-se louco de tanto tentar encontrar uma saída.
[Ernande Valentin do Prado publica na Rua Balsa das 10
às 6tas-feiras]
[1]
Elite Branca, no Brasil todo, tem de várias cores: elite branca Japonesa, elite branca parda e
de vários outros tons. Ser elite branca é quase um estado de espírito.