Ernande
Valentin do Prado
Marcelo era machista, metido a garanhão e tratava as mulheres como objeto. Costumava dar notas para cada uma segundo seus atributos físicos.
Beto
não concordava com nenhuma de minhas propostas nas reuniões do grêmio escolar. Costumávamos
quebrar o pau nas reuniões, quando lhe dizia que não adiantava puxar o saco dos
professores.
Orlando
era populista (além de mulherengo). Na rua mexia com todas as mulheres, o que
me obrigava a andar do outro lado da calçada. Nos debates no diretório
municipal do Partido dos Trabalhadores (PT), sempre concordava com os argumentos
de todas as posições.
Paulo
era erudito, tinha memória fotográfica, sempre sabia mais do que os
professores e via na literatura um valor supremo e um fim em si mesma.
Adilson
sempre via uma razão divina para os acontecimentos terrestres e orava por mim
em sua igreja. No meu primeiro emprego foi me visitar. Passou mais de 18 horas
no ônibus e encarou 40 graus de temperatura. Na época nem geladeira tinha na
minha casa.
Altair
ia para aula com camiseta rasgada do Iron Maiden. Comia mais do que todo mundo
e era mais magro que todos.
Adriano
sempre deixava comida no prato, nos restaurantes onde a gente dividia a mesa.
Quando pegava em um microfone não parava de falar.
Ademar
era o sujeito mais completo que eu conheci. Sempre apontava contradições no meu
discurso. É um dos padrinhos de Alice.
Ronaldo
descobriu que adora ser Policial Militar (PM). É outro padrinho de Alice.
Junior
era humilde demais, generoso demais, solidário demais. E às vezes também era debochado
e irônico demais. É o terceiro padrinho de Alice.
Herivelton
não discutia, contava histórias e ia ao “bailão gauchesco” três vezes na semana.
Mirian
usava roupas que me deixava constrangido.
Adalberto
mentia de forma descarada. Apesar de diplomado em Universidade Federal, não
sabia escrever um bilhete com coerência.
Helena
achava Florence uma heroína que só tinha virtudes, mesmo tendo ajudado o
império Inglês a legitimar a guerra.
Sirley
me ligava tarde da noite em casa sem motivo nenhum, a não ser para saber onde
eu estava.
Cecília
queria ganhar muito dinheiro para comprar tudo que tivesse vontade. Seu maior
sonho era arrumar um marido rico para lhe sustentar.
Paula
achava o cúmulo do ridículo a professora não conseguir pronunciar o plural nas
frases ou errar a concordância verbal. Ficava zombando, desqualificando e
ignorando todas as outras qualidades que a professora tinha.
Luciana
ia de carro importado para a aula. Chegava sempre atrasada. Tinha apartamento no
centro de Curitiba, duas empregadas e na escola nunca entregava um trabalho
dentro do prazo.
Gustavo
chegava atrasado a todos os plantões.
Maria
não podia ver trabalho que se escondia.
Fábio
tentou me contratar para fazer uma monografia sobre saúde do trabalhador para
ele.
Mário
só assistia filmes de ação e achava Deus e o Diabo na terra do sol um filme
idiota e mal feito.
Eduardo
achava que as músicas que eu escutava eram de mau gosto ou bregas.
Soraya
achava que todos os homens eram iguais e não prestavam.
Fabiola
era filha da orientadora pedagógica da escola. Não notava que eu era apaixonado
por ela, mas dançava comigo nos bailinhos da quarta série na escola Roberto
Brezenzinsk em Campina da Lagoa. Hoje é reporter da TV globo no Paraná.
Barbara
gostava de cheirar cola, mas já havia experimentado cocaína, maconha e crack.
Seiko
era muito organizada e metódica.
Tamara
queria sempre levar vantagem em tudo e sobre todos.
Sheila
queria escolher as camisas que eu deveria usar.
Marcia
era uma gênia, mas nunca soube ganhar dinheiro.
Seu
José sempre defendia os capitalistas, fazendeiros e políticos de direita.
Cristiane
era possessiva. Não tolerava disputar minha atenção com outras pessoas.
Guilherme
batia na namorada, algumas vezes apanhava também.
Toninho
vivia me dizendo para fazer faculdade e se desesperava com meu descaso
intelectual.
Ednei
(todo sábado) me convidava para tomar cerveja, comer batata frita com queijo e
falar mal da Sirley, de Jaime ou de qualquer outra pessoa.
Marilus
fumava demais e jogava fumaça na minha cara.
Gilmar
dizia que só idiotas gostavam de Mamonas Assassinas, mas ouvia escondido em
casa.
Rafael
ficava com o cabeço em pé cada vez que eu dizia as minhas verdades.
Jaldemir
tolerou-me enquanto pôde e despediu-se sem mágoas.
A
minha convivência com todos eles foi boa e duradoura. Acredito que porque nunca
tive que me anular, nunca tive que deixar de ser eu mesmo ou concordar com
todas as ideias diferentes deles e eles com as minhas.
Alguns nomes (mas nem todos) foram alterados para evitar identificar
pessoas vivas.
[Ernande
Valentin do Prado publica no Rua Balsa das 10 todas às 6tas]
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