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25 setembro 2015

ASBESTO

Ernande Valentin do Prado

E a morte é como pai
Que bate na mãe e rouba os filhos do prazer
De brincar como se não houvesse amanhã
Supercombo



Dizem que a operação Zelotes, da Política Federal, aquela que investiga a lista de sonegadores beneficiados pelo esquema do Banco HSBC – lembra? Não sei, não vi, mas afirmam que nesta lista tem o nome do Ratinho, da Claudia Arraia, da Família Marinho, dona da Rede Globo, dos proprietários do Jornal Folha de São Paulo, de vários políticos tradicionais que se passam por pessoas éticas, honesta e que lutam contra a corrupção do governo do PT.
Enfim, dizem que, se divulgada, a operação Zelotes poderia mostrar desvios e sonegações de impostos na ordem de mais ou menos 500 bilhões de dólares. Se conseguissem de volta apenas metade destes recursos, parece que evitaria a atual crise fiscal, não é verdade? Além disso, mostraria muita gente, que hoje aponta o dedo para o governo (e até atira a primeira pedra) com as calças na mão e, quem sabe, até com a bunda suja.
Tem gente dizendo que os esquemas do sistema financeiro, em especial do HSBC, fariam a operação Lava Jato parecer coisa de reles batedores de carteira. Não duvido, os poços, nestes casos, podem ser bem mais fundo e ter mais lama do que se pode limpar.
Desvio de dinheiro para o exterior é coisa que se faz neste país, ao menos desde que ele foi invadido pelos portugueses – ainda estão aí os descendentes da família real do imperador, que se beneficiaram de todo esse esquema e provavelmente são testemunha oculares (e atiram pedras também).  Mas, como nada é divulgado, como as investigações não avançam, a gente não fica sabendo de muita coisa.
Essa situação, silencio da mídia e do judiciário sobre as investigações de desvio de dinheiro no esquema do HSBC, enquanto se faz estardalhaço com as questões da Lava Jato, não deixa de ser uma vitória dupla. Ganha quem quer acreditar que a corrupção foi inventada pelo PT, e ganha aquela parte do PT que quer fazer-nos acreditar que tudo isso que se denúncia é um complô da direita, que não existe corrupção, que tudo isso foi inventado pela direita branca e raivosa, que o Zé é vítima, que está sendo perseguido por ser revolucionário e defender os mais pobres.
Acho que tudo que o PT e o PSDB falam um do outro, assim como o que se fala do asbesto, são verdades. E penso que é cego (ou mal-intencionado) quem acredita em apenas um dos lados ou que o asbesto não é cancerígeno.
Como não se fala da operação Zelotes, como forma de economizar e até de arrecadar recurso, fazer justiça, pôr na cadeira corruptores corruptos, falam em criar mais um imposto, a CPMF.
Gosto da CPMF porque ela obriga todos a paga-la e, é o mesmo valor para todos, ao menos proporcionalmente. O que, ao meu ver, é bastante equitativo e obedece ao princípio de justiça social: cada um pagando segundo sua renda e contribuindo com o todo. É inclusive uma questão de solidariedade e, a ganancia (ou melhor, farinha pouco meu pirão primeiro) explicaria parte dos motivos de ser contra (embora não seja o caso de todos que não são favoráveis a ela). Mas não sou muito bom de matemática e posso estar engado quanto a isso. Vai ver a CPMF é realmente tão ruim para mim, que não percebo que ela está sendo cobrada, quanto é para o proprietário do Bradesco, para a Xuxa, para FHC, que tem aposentadoria de 23 mil reais mensais (e nem por isso é contra, ao menos não era, quando foi o príncipe da privataria), como é para o Eduardo Cunha. Eles não terão como ignorar a CPMF, como eu, como boa parte do povo, ou têm?
Não sou só a favor da CPMF, mas de qualquer outro imposto que cobre de forma igual todos e não apenas quem ganha menos, que não sabe e não quer sonegar. Acho, inclusive, que se trocassem todos os impostos, por outros que taxassem pela renda, o mesmo percentual para todos, seria ótimo e simplificaria a cobrança. Assim, proporcionalmente, tanto eu quanto o Gilmar Mendes (que recebe um alto salário, pago com dinheiro de impostos, para defender tudo que é contra a população) ou os corruptores da Lava Jato, pagaríamos a mesma coisa, desde que não façam como fazem hoje, ou seja, enviem o dinheiro para a Suíça, por baixo dos panos do HSBC, mais ou menos, porém de modo profissional, como faz quem carrega dólar na cueca.
Por princípio, não sou só a favor de importo que incida na renda, mas de impostos de um modo geral. Afinal, minha filha estuda em escola pública (estes dias chegou em casa com um tênis novo, ganhou na escola), eu, tenho minha renda através do estado, estudo em faculdade pública, uso o SUS. Quando ando na rua (de minha cidade, não nas ruas de Miami, que não conheço), piso em calçamento pago com dinheiro público (de impostos), o lixo coletado em casa, três vezes por semana, não vai embora por milagre, mas porque os trabalhadores da coleta são pagos com dinheiro de impostos (uma mixaria, pelo tamanho do benefício). A luz que ilumina os postes na rua, a água que abastece minha torneira, são pagos com dinheiro de impostos. Até quem estuda no exterior, com bolsa do programa ciência sem fronteira ou qualquer outra bolsa chique que se destina à classe média, que eu saiba, faz com dinheiro de impostos (e não é mixaria, pela quantidade de gente que se beneficia disso), assim como quem recebe bolsa família. Também as grandes empresas, beneficiadas com subsídio, com renúncia fiscal, financiamentos para linhas de crédito que aumento a produção, infraestrutura, o consumo, são também beneficiadas com dinheiro de impostos. Até a polícia, que recolhe playboy fazendo racha com carro importado ou despeja de áreas ocupadas, quem não têm onde morar (na base da porrada), a mando do judiciário em conivência com o executivo e os proprietários das terras (muitas vezes griladas), faz isso porque está a serviço do estado (que paga seu soldo com recursos de impostos). Impostos, inclusive pagos por quem é despejado. Sem imposto, quem pagaria por isso?
Então, assumo, sou a favor de impostos, e não apena da CPMF. Acho que se ele aumentasse, principalmente para quem paga pouco, seria mais do que bom, seria ótimo. Sou a favor de taxar mais os cigarros, os combustíveis para carros de passeio, helicóptero, jatinhos particulares, que dá superioridade para a burguesia ostentação e poluição para todos, quem sabe taxando esse tipo de combustível, não se poderia ter tarifa zero no transporte (que passaria a ser de fato público)? E joias, relógios de luxo, Iphone, roupas de marcas famosas, tênis de 800 reais (produtos estes, dizem, feitos por trabalhadores escravizados ou muito precárizados e até por crianças). E quanto aos jantares (máster chef) de dois mil reais por pessoa, bolsas de 15 mil (geralmente feias), vestido de 150 mil (algumas vezes ridículos e vestindo pessoas desprezíveis). E o que dizer dos agrotóxicos aplicados nas lavouras de soja, que envenenam a terra, os rios, as pessoas, mas fazem bilionários no agronegócio? Esses tipos de consumo não poderiam ser melhores taxados e essas taxas usadas para minimizar seus males?
Eu assumo, se é para ter estado (particularmente preferia me virar com meus vizinhos, mas já que não dá) já que não dá para gente se virar sozinhos, sou a favor de cobrar impostos, cada vez mais, assim como sou a favor de ter um estado cada vez mais voltado para atender os interesses da maioria, do bem-estar das pessoas, dos animais, da fauna e da flora, de rios limpos, de produção de energia limpa, de menos rodovias e mais ciclovias. Sou a favor da proteção ambiental, amparo à infância, aos idosos, aos inválidos, aos doentes, aos fracos e oprimidos, enfim, sou favorável a não deixar ninguém sem oportunidades: casa, saúde, educação, cultura, lazer, alimentação, vestimentas.
Quem mais ganha, mais tem, mais é beneficiado por ações do estado: com bolsa de estudo no exterior para seus filhos, vagas nos melhores cursos das universidades públicas, benefícios ficais variados, salários exorbitantes, como do judiciário (que pouco benefício nos traz), com bairros mais seguros, ruas mais limpas, arborizadas. No entanto, são exatamente os mais raivosos defensores do estado mínimo, do fim dos impostos, do cada um por si e deus contra todos.
Tudo isso custa dinheiro (enquanto for assim que o mundo se organiza) sou favorável aos impostos: sou favorável que planos de saúdo não tenham subsídios (hoje quem paga convênio de saúde pode descontar uma parte dos impostos devido, ou seja, quem tem mais, continua tendo mais benefícios do estado). Além disso, os planos deveriam pagar por tudo que cobram dos clientes, mas é executado pelo SUS. Sou a favor de taxar lucro, grandes fortunas, heranças. Enfim, não sou a favor só de impostos, mas de outro tipo de relação entre os seres humanos, uma que não se guie por defender apenas seus direitos de ter, sem olhar o que outros não tem.
Claro, o fato de ser favorável a existência de impostos, não quer dizer que sou (ou estou) a favor da forma como eles estão sendo gastos, mas essa é outra conversa, não é mesmo?


[Ernande Valentin do Prado publica na Rua Balsa das 10 às 6tas-feiras]

07 março 2014

ÀS VEZES PARECE QUE TUDO ESTÁ DESMORONANDO

Ernande Valentin do Prado

Sei bem que existem exemplos (e não pouco) em todo lugar do contrario de tudo que escrevi ate agora sobre o comportamento dos seres humanos (ver textos anteriores). Até o globo repórter fez um programa sobre isso em 20 de dezembro de 2013. Eymard está escrevendo um livro sobre essas pessoas e estas situações (aguardem para ler). Mas são pessoas extraordinárias vivendo ordinariamente suas vidas de um modo extraordinário. A regra (ao menos ao meu redor) é de situações degradantes.
Quero falar de duas situações (quase distintas) para concluir essa série de reflexões sobre o Google e o apocalipse zumbi. Primeiro sobre como somos atendidos pelas pessoas normalmente e a segunda sobre como os profissionais de saúde nos atendem.

SITUAÇÃO 1

Até vendedor, que em teoria dependem da simpatia, está distratando o “cliente” nas lojas. Dois exemplos que vivi recentemente:
1.      Numa loja de colchão a vendedora mostrou-me colchões que estavam em cima de um guarda-roupa e queria saber se eu iria mesmo comprar antes de me mostrar.
2.      Fiz uma reclamação do serviço de internet e o atendente (sem argumento ou sem necessidade de argumentar) me mandou tomar no fiofó (estamos em pleno universo kafkiano após as privatizações que iriam nos salvar da ineficiência pública, segundo a ótica neoliberal).
Em breve as compras serão feitas apenas pela internet não apenas porque é mais barato e mais prático, mas para evitar contato com outros seres humanos. (já estou com vontade fazer isso – sinto, às vezes, que estou rodeado de zumbis por todos os lados e eu mesmo me tornando um).
Se pudesse não faria compras em supermercados. Cada vez que vou ao TODO DIA (rede Wal-Mart na Bahia) fico deprimido: sujo, bagunçado, produtos vencidos, profissionais mau pagos trabalhando quase que em regime de escravidão (não podem ir ao banheiro, contou-me uma operadora de caixa em um feriado). E o sindicato, perguntei ainda com essa mania de acreditar e ela respondeu, vem descontado três vezes ao ano, mas nunca vi nenhuma representa aqui. (Diferente do Google, o sindicato e os sindicalistas (ao menos no Brasil) não têm necessidade de provar nada ao trabalhador -  o acordo é com o patrão via conivência do estado).
  Se o google sabe que o ser humano precisa ir ao banheiro, porque os donos do Wal-Mart não sabem ou será que sabem e, assim como os professores sabem que ensinar não é transferir conhecimento, apenas não se importam? E os sindicalistas (que recebem contribuição compulsória do trabalhar) importam-se em conseguir alguma beneficio para a categoria?
De uma coisa tenho certeza, o Google sabe que tipo de capitalismo é esse e como se chama esse tipo de sindicalismo. Vá ao Google e digite PELEGO e veja o que vai aparecer.

SITUAÇÃO 2

Conheço uma cidade onde mais de 80% das consultas do Sistema Único de Saúde são agendadas com antecedência, o que é um avanço quando se sabe que em muitos lugares para conseguir acesso e ser mal atendido precisa ir para fila de madrugada. Porém, se quem organizasse o sistema fosse o Google, será que os atendimentos não seriam induzidos, com dia e hora marcada, assim como as compras o são?
Falei com uma Enfermeira estes dias sobre os seus relatórios de produção. Pela minha avaliação não era possível atender tanta gente em tão pouco tempo com a qualidade que se espera de uma Enfermeira que cuida e não apenas que atende. Queria entender se ela não preferia, ao invés de atender com base em problemas passados, atender com base em problemas futuros, ou melhor, trabalhar para evitar problemas futuros. Nada novo, apenas a boa, velha e básica prevenção de doenças.
Ela não entendeu bem do que eu estava falando e disse: “agora querem que eu tenha uma bola de cristal?”
Em um momento de paciência (que não são tão comuns em mim) disse apenas: pense nisso, depois conversamos e quem sabe descobrimos umas dez maneiras diferentes de prever complicações e antecipar demandas sem precisar de bola de cristal.
Sinceramente não acho que essa situação seja motivada apenas pela ignorância, pela desmotivação do trabalhador, pelos péssimos salários, pela falência do sistema de ensino, que está mais interessado em vender o “produto educação”, mas pela pouca importância que a gente dá ao outro. Prefiro mil vezes trabalhar com um profissional inexperiente, mas motivado, sensível, capaz de aprender, do que com um que sabe (ou pensa que sabe) muita coisa, mas não se importa o suficiente com o outro para por em prática seu saber ou para continuar aprendendo.
Quando era professor gostava de trabalhar com os alunos do primeiro semestre. Os levava para o meio do povo, das comunidades e deixava “o pau comer”. Meus colegas diziam que eles não sabiam nada, que não tinham o que ensinar e eu respondia: mas têm muito que aprender e se importarem-se com o outro vão aprender para dar conta de cuidar. Para mim a chave para aprender a cuidar é “preocupar-se” com o outro. Quem se preocupa em cuidar não se recusa a aprender/saber/fazer, olhar até em bolas de cristal ou consultar o Google.
Talvez o Google conheça não dez técnicas para prever e induzir o cuidado, mas cem, mil, dez mil. Vá saber.
Brandão disse que tudo que se ensina é aprendido (para o bem ou para o mal) acredito muito nisto. E aprendemos mais com os exemplos, com o que se faz, com as posturas do que com o discurso. Aprendemos e ensinamos. Por exemplo: na saúde é comum o profissional dizer que as pessoas só vão ao serviço quando estão doentes, que ninguém se previne não se antecipa e só procuram quando é urgência/emergência. Quase verdade. Mas o que está escondido neste discurso é que esse comportamento está longe de ser apenas natural, ele foi aprendido em anos de uma organização equivocado do sistema de serviços de saúde. Quando uma pessoa vai ao serviço com uma gripe ou que vai sempre ao serviço, o que se ouvi (e nem apenas pelas costas) é que esta tirando a vaga de outra por bobeira). Ou seja, o profissional ensinando que só se deve ir ao serviço quando o “caldo já entornou”. Comportamento bem diferente do Google, que não perde oportunidade de aprender e melhor servir em um ciclo contínuo de indução do consumo.
Temos muito que aprender (ensinar) com o Google e não estou falando só das informações, mas do comportamento.




[Ernande Valentin do Prado publica na Rua Balsa das 10 às 6tas-feiras]

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