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22 julho 2016

LUTA DE CLASSES: UMA OUTRA MORTE

Ernande Valentin do Prado

Em 05 de novembro de 2015, quando ocorreu o rompimento da barragem de rejeitos de minério de ferro, eu estava em Mariana, no Brasil. Você era, nesta época, um dos maiores acionistas individuais da Mineradora Samarco, fundada por seu pai em 1975 e incorporada a Vale do Rio Doce e a Australiana BHP. Entre 2010 e 2014 o lucro de sua empresa foi de 13,3 bilhões, o que lhe proporcionava uma vida de luxo e ostentação que humilhava a existência de pessoas como eu, meus familiares e amigos. Nossas vidas, para você e sua gente, não significava nada além de um incomodo ou benefício, dependendo do momento. Mas, de fato, não precisa de todos nós, apenas alguns bastavam.
Desta vez não morri de exaustão, morri antes de chegar a ser um trabalhador explorado. Não fui esmagado, esfaqueado, assassinado e amarrado no fundo de um rio, nem devorado por animais selvagens, mas nem por foi uma morte natural. Foi, como sempre, outra vítima de sua ganância cega, cruel, devastadora e indiferente. Morri aos poucos, durante 10 anos, desajustado, traumatizado, sem poder ouvir barulho de trovão sem ter uma crise nervosa, sem pai, sem mãe, só com um tio, tão desesperado quanto eu. A vida que deveria ter foi soterrada por 40 bilhões de litros de lama tóxica que escorreram sobre o vale do córrego Santarém, no caminho de minha casa, de minha vida, encobrindo as possibilidades que nunca conheci.
Eu, meu pai e minha mãe, morávamos no povoado de Bento Rodrigues, um lugarejo localizado abaixo da Barragem de fundão. Toda vila tinha pouco mais de 500 pessoas, todos trabalhadores explorados pela ganancia do ferro, uma vida de escravos do luxo alheio. Mas só hoje vejo isso, naquele tempo não tinha noção de nada, era apenas uma criança de seis anos, preocupada em brincar com os amigos da rua, cuidar de meu cachorro, pescar e nadar no córrego que passava nos fundos de casa.
Você disse, na imprensa, com olhos vermelho, que avisou os moradores por telefone, mas na rua de minha casa raramente tinha sinal de telefone. As sirenes de emergência não tocaram, ninguém veio avisar. Quando ouvimos o estrondo da tsanme de barro rompendo tudo que havia pela frente, já era tarde pra correr. Meu pai conseguiu tirar-me do fundo do quintal, onde brincava com meu cachorro, mas foi arrastando pela lama enquanto eu corria com meu tio.
Passei três semanas em um abrigo público, vivendo de doações de estranhos. Distraia-me com brinquedos doados, com a agitação de centenas de pessoas amontadas no mesmo lugar. No começo tudo era divertido, novo, fiz novos amigos, ganhei roupas novas, tomava agua mineral, tinha atenção. Mas aos poucos fui percebendo que minha mãe não voltava, que meu pai estava demorando demais a retornar, que meu irmão deveria estar com eles, mas que também não voltaria. Meu tio era o rosto mais conhecido, mas nem parecia mais ele. No seu rosto via o mesmo medo que via quando me olhada no espelho.
Um dia apareceram umas mulheres da mineradora, falaram com o tio, trouxeram roupas escuras. Fui vestido com uma camisa preta, calça e sapatos e levado para o enterro, coisa que nunca tinha visto antes. Disseram que meu pai, minha mãe e meu irmão nunca mais voltariam, que tinham ido morar no céu.
Depois nos mudamos para uma casa alugada pela sua empresa. Disseram que cuidariam da gente. Duas moças loiras, bem jovens e engraçadas conversaram comigo, fizeram um monte de perguntas sobre como eu me sentia, sobre o que pensava de meus pais estarem no céu, o que gostava de comer, se gostava da escola, de meu tio, de ver tv.
Não era só de meus pais que sentia falta. Queria ir pra casa, dormir em meu quarto, conversar com meu cachorro, subir nas arvores da rua, caminhar de tênis pela rua poeirenta até a escola. Onde estavam meus amigos, a tia da escola, a moça que servia merenda gostosa?
Vi na tv a casa coberta de barro até o telhado. Não tinha mais as ruas aonde andava, não tinha mais arvores, nem rio, nem escola, nem o campinho de terra aonde os moleques mais velhos não me deixava jogar futebol. Não tinha para onde voltar. Isso deu uma tristeza tão grande quanto a morte de pai, de mãe. Olhei o rosto de meu tio, mordendo sem vontade um pão com mortadela e descobri de onde vinha tanta tristeza, tanta falta de esperança de que ainda tinha uma vida pra gente.
Perdi a fome, sentei ao lado de meu tio, de frente para tv que mostrava as imagens da represa se rompendo e arrasando tudo em sua frente, mais uma vez, e outra e outra e outra vez. Um espetáculo de horror. Segurei a mão dele, sem falar nada. Não precisava.
Foi aí que lhe vi de terno e gravata, consternado, dizendo que faria tudo que fosse possível para devolver a dignidade para as pessoas que perderam suas casas, suas vidas.
Primeiro acreditei, afinal, como alguém poderia mentir numa situação dessas?
Mas o tempo foi passando, as coisas não acontecendo.
Arrumaram uma escola pra eu ir, trouxeram cadernos, lápis de cor novos, mochila. Mas na escola não conseguia me concentrar no que a professora falava, sentia sono o tempo todo, mas em casa não conseguia dormir e quando dormia acordava assustado imaginando que a lama estava, de novo, invadindo meu quarto, entrando pelo meu nariz, minha boca e me sufocando. As tarefas que a professora dava não conseguia terminar. No meio da aula, sem motivo, sentia vontade chorar. As outras crianças riam, tiravam sarro. As vezes não conseguia reagir, achava-me incapaz, um coitado, outras vezes reagia: uma vez bati em um colega mais novo até tirar sangue. A professora, no começo tinha paciência, depois foi perdendo, colocou-me no castigo, ameaçou suspensão. Depois fui trocado de sala. Depois de novo e de novo. No fim do ano, deste e de outros, fui aprovado, mas sem conseguir aprender o que tentavam me ensinar.
- Coitadinho, diziam as professoras, não consegue aprender.
Até que um dia desistiram: aluno especial, disseram.
Da sala dos especiais fui internado pela primeira vez:
Agressividade excessiva, disse a diretora pro médico.
- O que você pensa de sua vida, perguntou o médico?
- Penso em morrer e encontrar minha família no céu, respondi.
Passei três meses internado, tomava vários comprimidos por dia e não tinha forças pra nada. O corpo doía. A primeira vez que acordei de verdade, joguei-me do terceiro andar, quebrei os dois braços, e a bacia. Na cama, sem me mexer, sem poder ir ao banheiro, passava quase todo dia sujo, cheirando mal. Babava e balbuciava coisas que ninguém entendia nem queria ouvir.
Em pouco tempo abriu uma ferida nas costas, que aumentou, infeccionou, cheirava cada dia pior. A enfermeira dizia:
- Tem que fazer mudança de decúbito.
Aí me viram para um lado e deixavam o dia todo. Abriu outra ferida na coxa esquerda e aumentou, depois na coxa direita e passei a ficar de bruços, babando no chão.
- Meu tio, único parente que ainda estava vivo, veio me ver uma vez. A enfermeira, novinha, com uma cara de tristeza pior do que a minha e de meu tio, disse:
- Se não tirar ele desse hospital, vai morrer. Suspirou fundo e acrescentou: é só uma criança, não é justo.
Meu tio pareceu não entender. Passou a visita toda sentado em frente à tv. Tentou acender um cigarro, disseram que era proibido, mas que poderia fumar lá fora. Ele foi e a gente nunca mais se viu.
Não é justo, a vida não é justa com a maioria de nós. Mas você, sua gente, vivem em outro mundo, justificam seus luxos como um direito de nascença, igualzinho em qualquer tempo, em qualquer monarquia.
Morri sozinho, de madrugada, na ala infantil do hospital psiquiátrico. A enfermeira só descobriu meu corpo, morto, no dia seguinte. Vi quando rolou uma lágrima pela sua face rosada e lembrei-me que essa não foi a primeira vez que me matou. A nossa história era muito longa.

[Ernande Valentin do Prado publica na Rua Balsa das 10 às 6tas-feiras]

29 abril 2016

LUTA DE CLASSES: A PRIMEIRA MORTE

Árvore no entardecer o pantanal - Ronaldo Ávila (2007)
Ernande Valentin do Prado
PARTE 1

Todas as vezes, desde que comecei a me lembrar, a história termina do mesmo jeito: eu morro. Não (essa não é a palavra certa) a história terminada sempre com você me matando. Nem sempre faz isso de frente, olhando nos meus olhos, dando-me a chance de me defender. Muitas vezes matou-me pelas costas, na traição, em emboscada, enganado, traído. Já atirou no meu peito e deixou meus restos para os animais, me esquartejou, queimou, pisoteou com cavalos, atropelou com caminhão, esmagou em desmoronamento de mina de prata. Já me envenenou, deixou-me morrer de fome, bem lentamente, todo dia. Também de sede, de diarreia por água sem tratar...  
Mas volto sempre. Você também!
De verdade não sei quando foi a primeira ver que me matou. A memória é uma coisa esquisita, mas é a única verdade que importa. Claro, não falo da verdade dos historiadores, todo mundo sabe que a verdade depende muito da sinceridade com que se consegue olhar para si mesmo, encarar seus defeitos, virtudes, medos, hombridade, imperfeições mesquinhas. Falo da verdade que só conhece quem a viveu, como nós.

A PRIMEIRA MORTE

A primeira vez que você me matou foi em uma caçada à raposa. O dia estava frio, mas de sol claro, bonito. Você era o senhor das terras, montado em seu cavalo murzelo, com a comitiva de caçadores, cães e servos. Usava botas pretas de couro, cano alto para não ferir os pés. Ao seu lado, em um cavalo pequeno, vinha sua futura esposa, Irina, de 16 anos, filhas de uma família nobre, vizinha da propriedade senhorial.
Eu corria descalços pela mata, sem folego, tinha os pés feridos, os lábios rachados pelo frio. Junto aos cachorros, enxotando a raposa em sua direção. Um fim inevitável.
Você estava atrás de arvores frondosas, no final da clareira, num terreno elevado de onde poderia ver quando ela aparecesse. A raposa deveria seguir o seu plano e entrar no terreno e ser facilmente abatida. Mas ela me enganou, enganou os cachorros, fez seus próprios planos de bicho livre, dona da própria vontade e deu a volta sem ser notada. Você queria impressionar a noiva, que usava um vestido rosa, mostrar como era bom de mira, dar um tiro certeiro e lhe oferecer à pele avermelhada do majestoso animal.
Ficou furioso quando a raposa não apareceu, quando viu que não cumpriria sua promessa à futura esposa. Atirou no meu peito, quando sai da mata no lugar da raposa. Acertou pouco abaixo do coração, dando-me algum tempo para perceber que estava morrendo.
- incompetente, molenga, imprestável, como uma raposa pode enganar um homem? Você gritava enfurecido.
Quando o tiro me acertou, não dei conta na hora, apenas percebi o impacto no estômago, como um soco muito forte. Sei porque antes já havia me esmurrado assim. As vistas escureceram, senti as pernas amolecer, os braços perder as forças, senti um gosto amargo na boca, respirava com dificuldade.
Você desceu do cavalo, a moça de vestido rosa, sentada de lado na cela, ficou montada, olhando-me sangrar, mas indiferente.
- Imprestável, você repetiu com olhos de ódio.
 – viu o que me fez fazer, seu patife? Ao menos não foi um dos cães treinados, isso sim seria uma perda de valor.
Imagino que perguntei por que, mas não tenho certeza. Você continuou gritando, rosto vermelho, exaltado, culpando-me por não acertar a raposa:
- Oras, insolente, onde já se viu questionar seu senhor!
O rosto estava transtornado, furioso, sentia-se ofendido em seu direito de senhor das terras, humilhado na frente de sua futura esposa.
- Insolente, insolente, gritava descontroladamente.
Outros caçadores e servos chegaram, rodearam meu corpo, tentaram me amparar, mas você berrou do alto do cavalo, já se retirando:
- Deixa esse imprestável aí para os animais selvagens matar a fome.
Bateu com os calcanhares na barriga do cavalo e partiu.
O ano era 1.808, estávamos na Rússia feudal preste a ser invadia por Napoleão. Eu tinha 16 anos. Levei mais de 40 minutos para morrer, foi a primeira vez.

Meu sangue encharcou a terra e atraiu animais, que me devoraram completamente em três dias. 

[Ernande Valentin do Prado publica na Rua Balsa das 10 às 6tas-feiras]

25 setembro 2015

ASBESTO

Ernande Valentin do Prado

E a morte é como pai
Que bate na mãe e rouba os filhos do prazer
De brincar como se não houvesse amanhã
Supercombo



Dizem que a operação Zelotes, da Política Federal, aquela que investiga a lista de sonegadores beneficiados pelo esquema do Banco HSBC – lembra? Não sei, não vi, mas afirmam que nesta lista tem o nome do Ratinho, da Claudia Arraia, da Família Marinho, dona da Rede Globo, dos proprietários do Jornal Folha de São Paulo, de vários políticos tradicionais que se passam por pessoas éticas, honesta e que lutam contra a corrupção do governo do PT.
Enfim, dizem que, se divulgada, a operação Zelotes poderia mostrar desvios e sonegações de impostos na ordem de mais ou menos 500 bilhões de dólares. Se conseguissem de volta apenas metade destes recursos, parece que evitaria a atual crise fiscal, não é verdade? Além disso, mostraria muita gente, que hoje aponta o dedo para o governo (e até atira a primeira pedra) com as calças na mão e, quem sabe, até com a bunda suja.
Tem gente dizendo que os esquemas do sistema financeiro, em especial do HSBC, fariam a operação Lava Jato parecer coisa de reles batedores de carteira. Não duvido, os poços, nestes casos, podem ser bem mais fundo e ter mais lama do que se pode limpar.
Desvio de dinheiro para o exterior é coisa que se faz neste país, ao menos desde que ele foi invadido pelos portugueses – ainda estão aí os descendentes da família real do imperador, que se beneficiaram de todo esse esquema e provavelmente são testemunha oculares (e atiram pedras também).  Mas, como nada é divulgado, como as investigações não avançam, a gente não fica sabendo de muita coisa.
Essa situação, silencio da mídia e do judiciário sobre as investigações de desvio de dinheiro no esquema do HSBC, enquanto se faz estardalhaço com as questões da Lava Jato, não deixa de ser uma vitória dupla. Ganha quem quer acreditar que a corrupção foi inventada pelo PT, e ganha aquela parte do PT que quer fazer-nos acreditar que tudo isso que se denúncia é um complô da direita, que não existe corrupção, que tudo isso foi inventado pela direita branca e raivosa, que o Zé é vítima, que está sendo perseguido por ser revolucionário e defender os mais pobres.
Acho que tudo que o PT e o PSDB falam um do outro, assim como o que se fala do asbesto, são verdades. E penso que é cego (ou mal-intencionado) quem acredita em apenas um dos lados ou que o asbesto não é cancerígeno.
Como não se fala da operação Zelotes, como forma de economizar e até de arrecadar recurso, fazer justiça, pôr na cadeira corruptores corruptos, falam em criar mais um imposto, a CPMF.
Gosto da CPMF porque ela obriga todos a paga-la e, é o mesmo valor para todos, ao menos proporcionalmente. O que, ao meu ver, é bastante equitativo e obedece ao princípio de justiça social: cada um pagando segundo sua renda e contribuindo com o todo. É inclusive uma questão de solidariedade e, a ganancia (ou melhor, farinha pouco meu pirão primeiro) explicaria parte dos motivos de ser contra (embora não seja o caso de todos que não são favoráveis a ela). Mas não sou muito bom de matemática e posso estar engado quanto a isso. Vai ver a CPMF é realmente tão ruim para mim, que não percebo que ela está sendo cobrada, quanto é para o proprietário do Bradesco, para a Xuxa, para FHC, que tem aposentadoria de 23 mil reais mensais (e nem por isso é contra, ao menos não era, quando foi o príncipe da privataria), como é para o Eduardo Cunha. Eles não terão como ignorar a CPMF, como eu, como boa parte do povo, ou têm?
Não sou só a favor da CPMF, mas de qualquer outro imposto que cobre de forma igual todos e não apenas quem ganha menos, que não sabe e não quer sonegar. Acho, inclusive, que se trocassem todos os impostos, por outros que taxassem pela renda, o mesmo percentual para todos, seria ótimo e simplificaria a cobrança. Assim, proporcionalmente, tanto eu quanto o Gilmar Mendes (que recebe um alto salário, pago com dinheiro de impostos, para defender tudo que é contra a população) ou os corruptores da Lava Jato, pagaríamos a mesma coisa, desde que não façam como fazem hoje, ou seja, enviem o dinheiro para a Suíça, por baixo dos panos do HSBC, mais ou menos, porém de modo profissional, como faz quem carrega dólar na cueca.
Por princípio, não sou só a favor de importo que incida na renda, mas de impostos de um modo geral. Afinal, minha filha estuda em escola pública (estes dias chegou em casa com um tênis novo, ganhou na escola), eu, tenho minha renda através do estado, estudo em faculdade pública, uso o SUS. Quando ando na rua (de minha cidade, não nas ruas de Miami, que não conheço), piso em calçamento pago com dinheiro público (de impostos), o lixo coletado em casa, três vezes por semana, não vai embora por milagre, mas porque os trabalhadores da coleta são pagos com dinheiro de impostos (uma mixaria, pelo tamanho do benefício). A luz que ilumina os postes na rua, a água que abastece minha torneira, são pagos com dinheiro de impostos. Até quem estuda no exterior, com bolsa do programa ciência sem fronteira ou qualquer outra bolsa chique que se destina à classe média, que eu saiba, faz com dinheiro de impostos (e não é mixaria, pela quantidade de gente que se beneficia disso), assim como quem recebe bolsa família. Também as grandes empresas, beneficiadas com subsídio, com renúncia fiscal, financiamentos para linhas de crédito que aumento a produção, infraestrutura, o consumo, são também beneficiadas com dinheiro de impostos. Até a polícia, que recolhe playboy fazendo racha com carro importado ou despeja de áreas ocupadas, quem não têm onde morar (na base da porrada), a mando do judiciário em conivência com o executivo e os proprietários das terras (muitas vezes griladas), faz isso porque está a serviço do estado (que paga seu soldo com recursos de impostos). Impostos, inclusive pagos por quem é despejado. Sem imposto, quem pagaria por isso?
Então, assumo, sou a favor de impostos, e não apena da CPMF. Acho que se ele aumentasse, principalmente para quem paga pouco, seria mais do que bom, seria ótimo. Sou a favor de taxar mais os cigarros, os combustíveis para carros de passeio, helicóptero, jatinhos particulares, que dá superioridade para a burguesia ostentação e poluição para todos, quem sabe taxando esse tipo de combustível, não se poderia ter tarifa zero no transporte (que passaria a ser de fato público)? E joias, relógios de luxo, Iphone, roupas de marcas famosas, tênis de 800 reais (produtos estes, dizem, feitos por trabalhadores escravizados ou muito precárizados e até por crianças). E quanto aos jantares (máster chef) de dois mil reais por pessoa, bolsas de 15 mil (geralmente feias), vestido de 150 mil (algumas vezes ridículos e vestindo pessoas desprezíveis). E o que dizer dos agrotóxicos aplicados nas lavouras de soja, que envenenam a terra, os rios, as pessoas, mas fazem bilionários no agronegócio? Esses tipos de consumo não poderiam ser melhores taxados e essas taxas usadas para minimizar seus males?
Eu assumo, se é para ter estado (particularmente preferia me virar com meus vizinhos, mas já que não dá) já que não dá para gente se virar sozinhos, sou a favor de cobrar impostos, cada vez mais, assim como sou a favor de ter um estado cada vez mais voltado para atender os interesses da maioria, do bem-estar das pessoas, dos animais, da fauna e da flora, de rios limpos, de produção de energia limpa, de menos rodovias e mais ciclovias. Sou a favor da proteção ambiental, amparo à infância, aos idosos, aos inválidos, aos doentes, aos fracos e oprimidos, enfim, sou favorável a não deixar ninguém sem oportunidades: casa, saúde, educação, cultura, lazer, alimentação, vestimentas.
Quem mais ganha, mais tem, mais é beneficiado por ações do estado: com bolsa de estudo no exterior para seus filhos, vagas nos melhores cursos das universidades públicas, benefícios ficais variados, salários exorbitantes, como do judiciário (que pouco benefício nos traz), com bairros mais seguros, ruas mais limpas, arborizadas. No entanto, são exatamente os mais raivosos defensores do estado mínimo, do fim dos impostos, do cada um por si e deus contra todos.
Tudo isso custa dinheiro (enquanto for assim que o mundo se organiza) sou favorável aos impostos: sou favorável que planos de saúdo não tenham subsídios (hoje quem paga convênio de saúde pode descontar uma parte dos impostos devido, ou seja, quem tem mais, continua tendo mais benefícios do estado). Além disso, os planos deveriam pagar por tudo que cobram dos clientes, mas é executado pelo SUS. Sou a favor de taxar lucro, grandes fortunas, heranças. Enfim, não sou a favor só de impostos, mas de outro tipo de relação entre os seres humanos, uma que não se guie por defender apenas seus direitos de ter, sem olhar o que outros não tem.
Claro, o fato de ser favorável a existência de impostos, não quer dizer que sou (ou estou) a favor da forma como eles estão sendo gastos, mas essa é outra conversa, não é mesmo?


[Ernande Valentin do Prado publica na Rua Balsa das 10 às 6tas-feiras]

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