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09 novembro 2016

Vácuo

Dissecando.


Acordo de sobressalto. Passaram-se horas. Olho o celular, corro o dedo pela tela. Resposta urgentes (ou não). "Você está chateado?". "Um pouco". "Porque?". "Pelo vácuo". Vácuo cibernético. Vácuo de quem conecta-se desconectando. Estou em dúvida: devo ler ou fazer o almoço? Ou escrever? Ou estudar? Ou responder os e-mails? Decidi por ler. Por Twitar, por gritar, Trump eleito, desassossego caos, a poesia diz "trocando minha pura indiscrição pela tua história bem datada". Apreensões, e a chuva que me faz colher a roupa do varal. Respiro sentada no sofá, sentada na cozinha, sentada na vida. Olho esse ritmo frenético em todas as janelas dos outros apartamento, vejo-me em cada vidro de cada janela. Em cada vácuo. E recomeço a correr. 

Mayara Floss

18 maio 2016

O paciente ideal


Parede do hospital

O paciente ideal
Fala pouco
Não chora, não geme, não grita
Aceita e concorda com tudo
Segue as prescrições
Não usa celular
Não tem história social
Tem uma queixa exata
E apresenta só uma queixa de cada vez
Tem uma dor de descrição precisa
Não fuma, não bebe, não cheira
Não come demais
Não come gordura
Não come nada com açúcar (nem carboidrato)
Não faz muito sexo e sempre usa preservativo,
anticoncepcional, e todos os outros métodos possíveis
Tem três refeições por dia
Tem casa para morar
Sabe ler e seguir ordens
Toma a medicação na hora certa
Não faz cara feia
Tem no máximo um acompanhante
Sabe comunicar-se e expressar-se bem
Faz os exames no tempo certo
Não tem vícios
Tem dúvidas pontuais e de fácil resposta
O paciente ideal, senhores,
Não tem graça, nem troca.



(Poema-desabafo de muitos plantões)

Mayara Floss

12 fevereiro 2015

Do calar-se (julio alberto wong un)


No rumor imperceptível 
Da onda do sol da nuvem evanescente 
No acalanto do dia lento e bondoso 

Ao dizer que se faz me recomeço 
Ao respiro que toca escrevo percursos
Pela pele amada pela presença miuda

Sim. Sem algo menos a ser dito deixamos o mundo soar seu estrondo. 

Sim sim sim. 

Assim. Por baixo das estrelas me costuro em mim dentro do sabor dela que é eternidade dita em pele. Sempre sim. 

Fim de temporal. Fim de ventania. Fim do pouco que era para o todos que sou já sempre. 

A contemplação do mundo desde esse coração de proximidade se retorna se alheia se diz trapézio e corda solta

Porque voar é contigo bem-amada
Porque dizer é coisa de outros
O que é sacro se faz estalinho de lábios 
Desconto de dias e tempos nossos 
Recriação do primeiro dia do mundo
Acontecimentos deixados na areia
Aproximações descuidadas em desejo
Primeiros tempos primeiras histórias 
Desnudos temporais de vento e frio
Onde teu cheiro resumia o universo
E
Esse cabelo pensava sem palavra criava sem matéria 
Acordava sem ser sequer mas sendo lua e estrela juntas
E um pastel gigante de siri. 

O silêncio no tempo sem tempo do abraço 
O estrondo calado do mar no tempo dos bons ventos

Disse tanto sem dizer nada
Fosse tempo de flutuar nos tempos

Um expresso um doce de Portugal uma estrada completa no meio da areia 

E observar sem pensamento o raio que faz carinho na pele 

Até que a morte na sua risada absoluta
Renove o olhar profundo que nunca cessa. 

[Julio Alberto Wong Un escreve na Rua Balsa das 10 quando pode]. 





 

15 dezembro 2014

Moisés, Luis e surpreender-se assim assim dos acasos [Julio Alberto Wong Un

Para Renata e para Amelia. Para Eymard e para Ernande. Para Darlle e para Luciana. Para Marcia e para Vera Joana. Para Irai, Ingrid, Larissa e todos. Para Osvaldo e o Apanhador dos Sonhos. Para Aldenildo e os palhaços. Para os dias bons em João Pessoa 





1. O mar abre o peito coral. E Moisés acende as águas com seu báculo e destina um final de tempo com a flauta de cana. 

Eu dizia que acreditava em fortes verdades:

Que disco voador não pousa duas vezes no mesmo ombro de passarinho.
Estrada nova nunca leva a três lugares simultâneos, e que
O beijo da moça iria durar o tempo dele e não dela. Mas ela... (ah, a moça)

Mas o desejo o transforma (ah, o beijo) em tempo suspenso.
O infinito está em mim, as cascas das árvores viram livros e papéis inesperados
Dizer que uma porta ou uma mesa nos espera é coisa boba
Abrir o olho na distração dos sotaques é pecado perdoado ao perdido, ao renascido, ao pequeno.
Sim, perco o destino dos velhos ônibus cansados; sim
Farei de mim aquele que percorre e abre as peles. Farei de mim um pequeno verme impertinente. 

E
Assim
Ou assado em dia de calor com pele oculta e vermelha 
Serei o escondido, aquele que se lança ao espetáculo, aquele surpreso com os presentes invisíveis
Que já estavam lá, esperando ser e não ser, destinar e endereçar, cobrir as luas de estantes
Acorrentar o redondo da lua no sopro do mar quase africano.

Será que ao transpor lugares misturados de pizza massas mar e dois garotos sem idade
Que assomam a cabeça de índio de marés dos Andes, rios Esmeralda impossíveis, azuis d'Angola,
Eu serei o que ele era? Aquilo tocando duas estrelas de mar que saíram de Lima para se encontrar 20 anos depois?

Sei não. Sei sei. 

Me dizer que somos aquilo que sonhamos é óbvio. Na troca equilibrista das risadas,
Na lembrança imediata do tempo em que fomos músicos, na escuta festiva do dizer dos amores,
Nas trocas novas que nunca serão perdidas - uma mão que desliza tempo e amanhecer
Para que não passe, para que seja prece, para que vivamos sempre no verde calmo deste mar

Os estares são todos um.  Somos esos chicos de ojos grandes que tocaban sus instrumentos
Practicaban sus lunes y sus viernes y ensayaban a si mismos como si fuera siempre el tiempo de la canción. 

Y con eso venían los caminos e sus destinos mutantes. Y con eso nos perseguían ciertos amores centinelas, descubrimientos de nuevos sonidos, formas furtivas de besarse.

Encontrei o Moisés como um descuido meu. Mas ele estava lá. E as meninas o mostraram. Com seu sotaque tão distinto é tão próximo do meu. Com seu compartilhar discreto. 

.......

O Moisés ficou assim, pensativo, quando fui embora, nas nostalgias crianças. Foi destinado a mim um sorriso de portal de tempo. E um dizer de futuro.
Uma promessa um cartão e saber-se quase destinado a encontrar-se. 

Encontrar-se. Como fazemos sempre que o por acaso nos empurra à esquerda ou à direita. A ficar embevecido ou a mexer o mindinho e tocar de leve outra mão. Destino outro, escolha banal, reinvenção de mundos.

O menino da cidade imperial e dos campos de São João de Lurigancho riu e pensou e trouxe o tempo como pião ou escada a terceiros andares.  Y yo me fui quedando en mis propios recuerdos, mareado de tiendas, comensales, y seres raros que hablan el portugués. 

El día siguió con sus calles, sus soles, sus brisas de final de continente, de casi comienzo del África. Los tres queridos que en ese día éramos descubridores, convertidos e entregados, volvimos a las veredas esperadas, pero yo pensaba quietamente, como un poeta abriendo el "Sonetos de Shakespeare" por vez primera: qué será lo que tiene el mundo?

"Sopro e cheiro de mar", respondemos juntos. Sal na pele e voz amante ao ouvido. 

A promessa, sei eu, é o que ficou. Deep in the heart. Forever two young compadres. 

Hermano Moisés. Tu crees en dios ?. me dirías. Yo la verdad no mucho, retrucaría veloz. Pero a cada cierto tiempo el compadre Taita Dios  me hace ese tipo de chistes. Que se le hace? Habrá que reírse con él nomás. 


2. O mar abre o peito laranja/camarão. E o Luis me abraça Latino e reencontrado

Digo que reencontrei o Luis porque acho que eu o sonhei antes. Trinta anos antes. 1984. Ou talvez ele me ajudou a subir em algum ônibus de fronteira nos anos 80 antes de virmos os dois por separado ao continente brasileiro - cego / surdo / e mudo para tudo aquilo que o circunda na América Latina. E também nos encontramos nos comeres de camarão que foi João Pessoa. 

Eu vim e gostei daqui, ele nos contava, com seus mitos de hombre del Sur del Sur Sur, porque eso es el final sur de Chile, con sus bosques prehistóricos de árboles gigantes, de calladas madrugadas hasta que los pájaros invaden la humedad austral de Chile. Eu morreria aqui, disse ele. Eu moraria aqui, dissemos os dois.

Yo le dije, en perfecto portuñol: usted me diría Luis donde nació Neruda? Porque no me acuerdo. Donde habrá nacido me dijo. En el sur. Valparaíso? Más al sur. No me acuerdo ni quien es ese Neruda. Poeta no? Salí muy joven y poco he regresado. Todo en Chile es sur.

Oh tiempo escrito en Temuco, donde el fin del continente se afina y se retrae
Oh cuerpo perfecto de musgo y madera que se pudre para nacer de ella la vida por lado todo.
Oh amada de madera. Tus ojos son araucarias nodosas que transform en besos largos.
La estrella primera del frío es tu distancia, cuando no estas conmigo
Oh mujer de polos y cercanías, desnuda me apareces como el cuerpo que me inventa
Como el final de los valles que me llama. Como la risa de los pájaros cuando la lluvia es buena.

Assim eu fui brincando de Neruda e ria sozinho, no meio dos camarões e das cebolas,  tudo a ver com o glutão de Temuco. Mas era hora das partidas. E eu já andava com o peito esburacado de ausências iminentes, de despertares azuis quando queria as cores do cheiro e os aromas dos barros da fronteira. E eu disse tchau.  Tchau seu Luis do Sul do Chile. 

Yo lo busco de nuevo Don Luis que fue gerente y ahora no puede ir así tan fácil a la propia tierra, al final del tiempo que son los bosques de araucarias. 

Os pulos quânticos são corriqueiros. A surpresa pula quântica e balsâmica.

Digo que termino porque apenas começo. I say love songs in the sunset, pedra de responsa.



Nota: explicação de poema: explicação estraga tudo, em especial poema. mas só dizer que isto aqui nasceu de 2 encontros com um peruano e um chileno em restaurantes de João Pessoa. Em Dezembro de 2014.







[Julio Alberto Wong Un escreve na Balsa das 10 às segundas]











06 outubro 2014

Gratidão prece sacrifício e luas [Julio Alberto Wong Un]





Ensolarado o tempo
Campos dentro de si mesmos
Formas suaves do vento. Carícias pulsam. 
Tecidos, escadas, bichinhos de pelúcia vigilantes
Lista de listas. Sangue de sangue. 
Desconheço o verniz do tempo. Ou melhor, 
Descarto-o
Feito luz como se fosse um caramujo apaixonado. 
O pulsar do poema incrustado nas unhas
A carência das certezas deslocada de tudo 
Digo a ninguém 
Espalho espelhos e rochedos pífios
Calço com novas mãos velhos sapatos
A areia de distantes praias nos veste os dedos
Em mim sou outro. Em mim se faz oco. 
Nuvens mais poderosas que o sol.
Hálito mais rude que os pássaros de rapina que cuidam da minha morte. 
Onde descobrir a certeza? 
Qual o tempo em que renasço?
Névoa diz-se tristeza. Que imagem idiota da cultura da praia. 
Aconchegado recolhido silente
Espero. 

17 setembro 2014

Voo


Qual o peso da asa
de quem voa?
Qual o voo
que não bate asas na terra
ou que caminha pelo céu?
Mas quem pousa os pés no chão
É porque também voa.

Mayara Floss
[Mayara Floss publica na Rua Balsa das 10 às 4as-feiras]

18 agosto 2014

Una mujer joven descansa en el suelo del centro cultural Garcia Márquez


Una mujer
Tiene la forma de una cometa
Papalote, ala de viento, palabra encontrada. 

Ella descansa de ojos cerrados y
Sonrisa suave y dibujada

El sol de la tarde de Bogotá la esta volviendo dorada
Y el tiempo está estático y hecho de retornos

A su lado una mochila de los indios de la Sierra Nevada de Santa Marta evidencia
Su complicidad conmigo, el escribano. 

En algún momento yo no paraba de decir y decir
Antes que uno mismo se congelara para después soñar en recuperarse

Pero no
Pero si

Todo eso es poco importante 
Si no tal vez la tarde de Bogotá
Cuando ella se dora y sueña
Y alguien como yo, pasajero, imagina entrar silencioso en ese sueño

Como un relato inconcluso del Gabo
O una canción rara de Maria Mercedes Carranza. 



[Julio Wong Un escribe en la Calle Balsa de las diez los lunes]

04 agosto 2014

COM - PASSO [Maria Amelia Mano]


O vio
lento
Des
caso
O sel
vagem
Aban
dono
Mastigue
Des
figure
Des
fie
Trans
forme
Incendeie
Fogo
Fagulha
Cinza
Vento
Poeira
Chão
Passo
Menino
Moreno
Trabalha
De dia
De noite
Sonha
Pintar
Infinito
Mundo
Esperança
Alma
Renasce
Luar
Sorrindo
Dançando
Ciranda
Cantiga
Voar
Olhar
Ternura
Pra mim
Que ainda choro sem saber por que







[Maria Amélia Medeiros Mano publica na Rua Balsa das 10 às tercas]

05 maio 2014

MARCHA SOLDADO, CABEÇA DE PAPEL...

            Eu, Aninha e Raquel, manas de todas as tardes, árvores, bonecas, bolas, calçadas, brincadeiras. Mas as coisas mais arriscadas, as maiores aventuras, era ele mesmo...


            Pai.


            Me colocou na garupa de um cavalo, ainda bebê. Me deu pato, pinto, cachorro, carneiro e pedras de lugares especiais. Se embrenhou com a família inteira em uma mata fechada pra pegar uma árvore de natal e inventou estórias fantásticas em trilhas de terra.


            Atravessou o Brasil inteiro mais de uma vez. Uma vez, dentro de um carro em cima de um caminhão e em outra vez, em ônibus clandestino, com boia fria. Comprou um gravador para gravar nossas vozes e comprou fita K7 do Roberto Carlos pra ouvir na brasília amarela com placa de Quixeramobim, em mais uma viagem atravessando o Brasil.


            Sim, ele que me ensinou a gostar de Roberto Carlos, também de Globo Rural e Rolando Boldrin. Me ensinou a levar toalha pequena pra viagem. Me fez amar pão com manteiga, pão com ovo, pão com carne, farofa de ovos, banana na comida, limão no feijão e na sopa, café preto, doce de gergelim e suco de manga.


            Não guarda segredo. Diz o que pensa e nem sempre agrada. Sonhou demais. Sonha demais, sempre demais... Confia em quem é pouco confiável e desconfia de gente boa, se achando esperto. Esquece dos erros com a mesma facilidade com que embarca em algum plano mirabolante.


            Me ensinou e ser honesta, a ser íntegra, a trabalhar e a respeitar a terra. Me ensinou a não temer ou matar insetos à toa,  porque fazem parte do equilíbrio da vida, do mundo. Me ensinou a pegar em lagartixas e sapos, que são bichinhos bons e anunciam chuva. E me ensinou a desejar chuva, a gostar de chuva, do cheiro da chuva, do banho de chuva...


            Dos cheiros, aprendi com ele a gostar de cheiro de vaca, de cavalo, de curral e de besouro mal cheiroso que ninguém gosta. Mas não aprendi a adivinhar a planta pelo cheiro da folha macerada. Algo que ainda insiste em me desafiar! E das plantas, me fez descobrir o nome, o que era fruto, o que era flor, o que era inflorescência, o que era parente do feijão e da papoula. O que é praga, o que é veneno e o que é defesa e sustento.


            Dirigiu jipe no meio do mato e plantou, plantou tanto que ainda não parou. Mostrou o que é curva de nível. Jeito da plantação não destruir o solo, jeito que respeita a terra, protege, cuida. E também construiu casas e constrói sonhos e danças malucas. Inventa canções e palavras estranhas que jura, sorrindo, que existem.


            Limpou rua e calçada, brigou com vizinho e disputou com a mãe o espaço do jardim pra plantar alface. Faz o melhor doce de leite, a melhor canjica, a melhor saladinha verde com cebolinha e coentro que ele mesmo planta. Também me ensinou a jogar futebol, a jogar bola de gude, a nadar, a andar na mata.


            O melhor, esse menino que chamo pai, me fez e me faz descobrir. Prova que as pessoas são múltipas, são muitas, são imperfeitas, são mágicas, sempre recomeçam e algumas nunca cansam, nunca desistem. As pessoas dão o que tem, o que podem, o que sentem, o que vivem.


            Velho, nenhum conselho teu tem muito cabimento porque nem tu mesmo consegues te seguir, não te obedeces... Desordem que brota no olhar menino e na lógica sem lógica. Aprendo a conhecer teu mundo, teu rumo. Te encontro em muitas coisas em mim e isso encanta e assusta. Me surpreende.


            Há amores e solidões. Aventuras e desejos de voltar. Há magias e desesperos e sonhos que acalentamos sozinhos, na rede, na fronha, na grama, no sono depois do almoço, no sol que se aproveita pra esquentar. Somos esperançosos. Somos viajantes. Somos inquietos. Somos desejantes. 



            Gostamos de música alta, de sonhar e dormir de tarde.

Amamos feira, mercado e experimentamos comidas novas, temperos, pimentas, caminhos, histórias, atalhos e destinos com uma certa dose de irresponsabilidade. Erramos...



            A imagem que embala e alegra. Sala séria e vazia do teu trabalho. Muitas cadeiras e mesas. Nós três, pequenas, atrás de ti, em fila, marchando. Tu na frente, desviando dos móveis, batendo forte nas mesas: "marcha soldado, cabeça de papel, quem não marchar direito vai preso no quartel..."



            Lá vai tu de novo, em viagem pelo Brasil. Me preocupo porque já não és tão forte. Porque és metido a esperto e mais que tudo, porque te amo muito e mesmo que já não inventes brincadeiras e aventuras malucas, ainda és o primeiro da fila, na marcha de soldados, menino e meninas, em fila, na memória mais acarinhada da minha infância. A infância que sempre vais fazer parte.

10 março 2014

O sono e o beijo

Pelotas - 2013


descubro, aprendo, em tempos de sonolência, que o amor nos acorda
que a saúde vem do amar
que andar as ruas em sorte de beijo é deixar atrás mal-estares
que o corpo pode estar invadido
mas as luzes do verão limpam o estagnado
em cinco ou seis horas eu sinto a luz dentro de mim
as mesmas ruas viram outras
os passos repetidos despertam a carícia oportuna

assim, a receita não é viver bem para ser sadio
mas encher-se de saúde-amor para viver bem
mas isto é oferenda, presente inesperado, sempre

a força exagerada que vem do encontro
é o verdadeiro milagre

é sutil o toque ou o beijo
é aberto o tempo do sol elevar-se e dizer
é eterno o abraço dos corpos de todos os amantes
e luz que vem do olhar da criança
a missanga que é oferecida como brinquedo ou promessa

eu, bichado, em espera de utopia boa, celebro jubiloso o dizer dos amores
sou mais do que me limita, sou mais do que me descreve

te dizer, te confirmar, te saber, te mergulhar, te espaço e luz de tarde

a cada casa o sono vira beijo, a cada metro o tempo vira esperança




[Julio Alberto Wong Un publica na Rua Balsa das 10 às 2das-feiras]

09 março 2014

Paladar - Silvio Rodríguez




Paladar
Silvio Rodriguez


Llego al club de los cincuenta
y una mano trae la cuenta.
Llama la atención la suma
desde hoy hasta mi cuna.
Cada fuego, cada empeño,
cada día, cada sueño,
viene con importe al lado,
a pesar de lo pagado.

Me pregunto qué negocio es éste
en que hasta el deseo es un consumo.
¿Qué me haré cuando facture el sol?
Pero vuelvo siempre el rostro al este
y me ordeno un nuevo desayuno
a pesar del costo del amor.

Vengan deudas, inflaciones,
vales, multas, recesiones.
Pruebe a arrancarme el ratero
el sabor de mi bolero.
Sea quien sea el gerente,
me lo cobre diligente
(ya sabrá esa mano cruenta
cuando le pase mi cuenta).

Me pregunto qué negocio es éste
en que hasta el deseo es un consumo.
¿Qué me haré cuando facture el sol?
Pero vuelvo siempre el rostro al este
y me ordeno un nuevo desayuno
a pesar del costo del amor.





26 janeiro 2014

Gioconda Belli - No me arrepiento de nada



Desde la mujer que soy,
a veces me da por contemplar
aquellas que pude haber sido;
las mujeres primorosas,
hacendosas, buenas esposas,
dechado de virtudes,
que deseara mi madre.

No sé por qué
la vida entera he pasado
rebelándome contra ellas.
Odio sus amenazas en mi cuerpo.
La culpa que sus vidas impecables,
por extraño maleficio,
me inspiran.
Reniego de sus buenos oficios;
de los llantos a escondidas del esposo,
del pudor de su desnudez
bajo la planchada y almidonada ropa interior.
Estas mujeres, sin embargo,
me miran desde el interior de los espejos,
levantan su dedo acusador
y, a veces, cedo a sus miradas de reproche
y quiero ganarme la aceptación universal,
ser la Gioconda irreprochable.
Sacarme diez en conducta
con el partido, el estado, las amistades,
mi familia, mis hijos y todos los demás seres
que abundantes pueblan este mundo nuestro.
En esta contradicción inevitable
entre lo que debió haber sido y lo que es,
he librado numerosas batallas mortales,
batallas a mordiscos de ellas contra mí
-ellas habitando en mí queriendo ser yo misma-
transgrediendo maternos mandamientos,
desgarro adolorida y a trompicones
a las mujeres internas
que, desde la infancia, me retuercen los ojos
porque no quepo en el molde perfecto de sus sueños,
porque me atrevo a ser esta loca, falible, tierna y vulnerable,
que se enamora como alma en pena
de causas justas, hombres hermosos,
y palabras juguetonas.
Porque, de adulta, me atreví a vivir la niñez vedada,
y rompí lazos inviolables
y me atreví a gozar
el cuerpo sano y sinuoso
con que los genes de todos mis ancestros
me dotaron.
No culpo a nadie. Más bien les agradezco los dones.
No me arrepiento de nada, como dijo la Edith Piaf.
Pero en los pozos oscuros en que me hundo,
cuando, en las mañanas, no más abrir los ojos,
siento las lágrimas pujando;
veo a esas otras mujeres esperando en el vestíbulo,
blandiendo condenas contra mi felicidad.
Impertérritas "niñas buenas" me circundan
y danzan sus canciones infantiles contra mí
contra esta mujer
hecha y derecha,
plena.
Esta mujer de pechos en pecho
y caderas anchas
que, por mi madre y contra ella,
me gusta ser.



[aos sábados e domingos a Rua Balsa das 10 publica textos de convidados, e textos livres]

23 janeiro 2014

O sentido salva [Eymard Mourão Vasconcelos]


O SENTIDO SALVA




"CIDADEZINHA QUALQUER
         Carlos Drummond de
         Andrade

Casas entre bananeiras
mulheres entre laranjeiras
pomar amor cantar.

Um homem vai devagar.
Um cachorro vai devagar.
Um burro vai devagar.

Devagar... as janelas olham.

Êta vida besta, meu Deus."

       * * *

Será mesmo besta, Drummond?
Pode ser, pode não ser.
Besta, se forem esses  atos
rotina falta de opção.

Rica
se os passos
e os olhares
tiverem um sentido
na busca e na história
do homem que vai
da  mulher que olha.
O sentido salva o ato
de sua mediocridade.

Entre o jantar no restaurante francês
e o P.F. no bar da esquina
a diferença maior não são as iguarias
mas o sentido do jantar na vida dos comedores.

Entre a trepada cheia de malabarismos
e o encostar a cabeça no ombro do namorado
a diferença maior não é a intensidade do prazer
mas o sentido do encontro na vida dos amantes.

Jantar refinado
sem encontro
sorrisos formais
gentilezas vazias.
Jantar sem gosto.

Marmitas com ovo, arroz e feijão
comidas com alegria
em comunhão.
Satisfação.
Um monumento na memória.

Lavar as meias do amado.
Levantar com amigos
as paredes do futuro lar.
Limpar o vômito
do filho doente, querido e carente.
Desdobrar-se no trabalho
para pagar a viagem sonhada.
Atos carregados de sentido
carinhos miúdos
inseridos numa história
com sonhos e esperança.
Realização.

Sentido
elo entre o cotidiano e o sonho.
Homem
bicho com o olhar para o alto.

O prazer
A beleza
O sentido
Trio mágico
a resplandecer a vida.

         * * *
Novo século
desmoronamento das utopias
sonhos confusos
Propagação comercial de ilusões,
parafernálias de comunicação
para massificação de projetos políticos.
Esperanças instáveis
desconfiadas.

Gestos com sentido questionado
sentido hesitante
vazio do cotidiano.
Restou o sentido animal
do prazer imediato.
Restou o sentido primário
da busca do reconhecimento imediato.

Crise do gesto
crise do viver.
Jantar sem sal
carinho oco
trabalho que é só trabalho.
Êta vida besta, meu Deus.

Na ausência de sonhos persistentes
que orientem com firmeza os sentidos dos gestos
resta a esperança
de novas descobertas.
Cada ato é uma busca,
gestos a procura do sentido.
O sentido é a busca.

         * * *
Educação
construção conjunta do conhecimento necessário,
busca intencional de novos sentidos,
esforço de traduzir e dialogar os sentidos dos outros.

Educação em saúde,
busca, em conjunto, do sentido
do cuidado do corpo
do cuidado com o outro.

18 janeiro 2014

Francisco predica a las aves (un poema de 1990)


Miraflores, Lima, Peru, 2012





Francisco predica a las aves
a Luz Alva







Chala. 1216. alrededor tuyo, cuarenta niños como pájaros
en esta pampa verde donde alguien dejará una escuela.
en este lugar verde con el rostro barbado en el cerro y otros árboles que no conozco
te sientas con el cabello libre en trenza y los ojos rodeándolo todo. te sientas cruzando las piernas
igual que los niños  - acaso otro niño y otra vocecita esperando los juegos - sobre la hierba
el color claro de la madera clareada
la boca dejando amor al aire: lo que importa es que se sientan bien
que crean en algo  que ese algo no los utilice. esta pampita de Chala
te esperará ochocientos años a que vuelvas
y a que yo trace estas memorias de futuro  cuando te conozca  dulzura
en esta escuela que no existe todavía
en este barro que espera ser una casa  y en esos niños que esperan ser aves
para escucharte




día de San Pablo, Asís 1216.














[Julio Alberto Wong Un publica na Rua Balsa das 10 às 2das-feiras]
[Chala é uma comunidade camponesa nas alturas do distrito de Bambamarca, Cajamarca, norte do Peru]

16 janeiro 2014

Poetas guerreiros




O belo é algo que podemos ser
individualmente e socialmente.
Ter esperança é manter-se ligado a esta possibilidade.
Nossa alma se deleita naquilo que é belo.
Os poetas evidenciam a beleza e a ternura já presentes.
Ajudam manter a fidelidade à possibilidade de beleza.
Reconduzem-nos à simplicidade do que é essencial
onde a ternura e o infinito habitam.
Nossa alma se deleita naquilo que é terno e infinito.
Há educadores que são poetas.
Trabalham para ampliar beleza e ternura na sociedade
para o deleite de todas as almas
contra as forças da exploração.
Sensibilidade e enfrentamento.






Recriação de Eymard a partir de anotações de textos de não sei mais quem. 
Para contrariar o Júlio que não gosta deste ideário guerreiro e nem gosta de versinhos explicadinhos,  com cheiro de escrito didático.
É tão bonzinho provocar os amigos.





[Eymard Mourão Vasconcelos escreve na Rua Balsa das 10 às 5as-feiras]

11 outubro 2013

Textos Velhos (JWU): Ernandianas 3: a luz que sai do olhar


Um tempo que se diz azul
E eu chamo simplesmente de perfeito
O entardecer na Redenção, cruzando de passo a passo
Um lado para outro
A palavra beleza querendo sair dentre os dentes
E a língua acarinhando-a, perfeita, lúcida
Desejo iluminado
Intelecto intuitivo
Peleja de abraços
No meio do parque
No final da calçada
Nos velhos viveres re-editados
Luzes
Partes de corpos sarados ou desejados
Um gesto de casais amando-se
Luzes
E dentro de mim
Sabores
da flor da Cidade Baixa

Textos Velhos (JWU): Ernandianas 1: no Parangolê...



Dourado - da cor da cerveja.
Uma forma do Jesus e dos Apóstolos.

Nus de palavras, sem poder nenhum, a Cidade é
Baixa, como os passos silenciosos da trupe.

Assim, depois dos afazeres,
Nesse mundo de 7000 seres e caos os quase irmãos de piada e utopia
Andamos essa penumbra de cidade amada, esse sol que vai-se dormindo até novo aviso
E, por enquanto tanto e tanto será feito
Para alimentar os entardeceres de Paripiranga, as luzes de meio-dia da Vila Dique,
A frescura surpresa da brisa no meio da Ponte Rio-Niteroi,
Uma Vila de São Carlos...
Santa Teresa
Ou algum outro sinal que não sabemos, que não sentimos sequer
E que - ignorantes e felizes - nos move à suavidade de um copo, a um pedaço de calçada,
À luz distante de uma promessa ou de um bar
E desde violões e ovos sonorosos somos testemunhas dos corais e dos tremores
Escondidos durante o dia e que - corujas noturnas - manifestam seu poder de amar e curar
Enfeitam nosso Amor, nossa risada exagerada, os contos e giros do Ernande,
Suas raivas bíblicas, as formas novas com que o mar se separa e
O povo vai fugindo ao encontro de terras de leite e mel
Que, desencanto, são vendidas e adulteradas, mas são
Saborosas na essência mais essencial das essências
Horas ou anos se comprimem no meio dos copos e do queijo, pimenta e goiabada... 
E embora todos na mesa soubessem que ele preferia a boa e simples Polar
O nosso urso dos encanamentos vai bebericando solidário e agradecido
Chopes artesanais, corujas, lagartixas, veados, comidas estranhas
Sotaques indeterminados ou pelo menos quânticos
E voa feroz ate os taxis do Olaria... E desaparece pela noite gulosa 
Ate nova missão de profeta... Aquele que anuncia o novo... Aquele que mostra os caminhos
De tortas linhas, de senhores despidos, de poderosos ridículos

Os outros, somente peregrinos,
vemos o urso enfiar-se rápido nos encanamentos
E esboçar sorriso cruel


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